Prof. Hélio Zylberstajn pesquisa a evolução do mercado de trabalho brasileiro nos últimos 6 anos
Um balanço do mercado de trabalho: 2012-2018
Hélio Zylberstajn – Professor sênior da FEA/USP e Coordenador do Projeto Salariômetro da Fipe
Nos últimos seis anos, nossa economia passou de um nível intenso de atividade econômica para uma recessão sem precedentes e agora ensaia uma recuperação tímida. Nesse período, passamos do quase pleno emprego para um desemprego gigantesco. As dificuldades do mercado de trabalho podem ser atribuídas apenas à flutuação do ciclo de conjuntura, ou há mais alguma coisa ocorrendo?
Para responder à pergunta, vou utilizar a PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), um valioso instrumento para o acompanhamento das condições socioeconômicas e demográficas do país. Esta pesquisa tem cobertura nacional e abrange todos os tipos de inserção no mercado de trabalho, quer sejam formais quer informais.
Vou examinar a evolução do mercado de trabalho brasileiro nos últimos 6 anos, segundo duas dimensões: a distribuição dos trabalhadores entre os setores econômicos (estrutura setorial do emprego) e a maneira como eles se inserem no mercado (posição dos trabalhadores nas suas ocupações).
Distribuição setorial do trabalho (Tabela 1)
Apesar da recessão de 2015-2016, três setores tiveram expansão no emprego no período considerado: Serviços (mais 3,3 milhões de trabalhadores), Administração Pública e Serviços Sociais (mais 1,6 milhões) e Comércio (mais 800 mil).
Outros três setores diminuíram sua demanda de trabalho: Construção (menos 900 mil), Indústria (menos 1,2 milhão) e Agricultura e Pecuária (menos 1,8 milhões).
Na produção de bens, foram eliminados 3,9 milhões postos de trabalho, enquanto nos serviços e no comércio, foram criados 5,6 milhões.
O caso da Agricultura e Pecuária é particularmente ilustrativo: embora a produção tenha crescido continuamente ao longo das últimas décadas, o setor tem se tornado menos intensivo em trabalho.
Embora menos visível, isso ocorre em todos os setores, o que leva à conclusão de que a redução de postos de trabalho não é apenas resultado da recessão, mas também da introdução de tecnologias poupadoras de mão-de-obra.
Tabela 1Evolução da distribuição setorial das pessoas ocupadas (em milhões de trabalhadores)
PNAD/IBGE – 2012 a 2018 (1º Semestre)
Setores | 2012 | 2013 | 2014 | 2015 | 2016 | 2017 | 2018 | Variação 2012/18 |
Serviços | 27,4 | 28,0 | 28,9 | 29,3 | 29,3 | 30,4 | 30,7 | 3,3 |
Adm. Pública e Serv. Sociais | 14,5 | 14,6 | 15,1 | 15,3 | 15,6 | 15,6 | 16,1 | 1,6 |
Comércio | 16,6 | 17,1 | 17,4 | 17,6 | 17,4 | 17,5 | 17,4 | 0,8 |
Subtotal Comércio/Serviços | 58,6 | 59,7 | 61,4 | 62,2 | 62,3 | 63,5 | 64,2 | 5,6 |
Construção | 7,5 | 7,9 | 7,8 | 7,5 | 7,3 | 6,8 | 6,6 | -0,9 |
Indústria | 13,1 | 12,9 | 13,2 | 12,9 | 11,6 | 11,7 | 11,9 | -1,2 |
Agricultura e Pecuária | 10,3 | 10,2 | 9,6 | 9,5 | 9,2 | 8,6 | 8,5 | -1,8 |
Subtotal Produção de Bens | 30,9 | 31,0 | 30,7 | 29,9 | 28,1 | 27,2 | 27,0 | -3,9 |
Total | 89,5 | 90,8 | 92,1 | 92,1 | 90,4 | 90,6 | 91,2 | 1,7 |
Portanto, os dados mostram:(a) a dificuldade que tivemos em fazer expandir o emprego, que cresceu apenas 1,7 milhões em 6 anos;
(b) o deslocamento de postos de trabalho do setor de produção de bens para o setor de comércio e serviços, e
(c) a adoção de tecnologias poupadoras de mão-de-obra.
Posição na ocupação (Tabela 2)
Além das mudanças na distribuição setorial, houve transformações importantes nas maneiras como os trabalhadores se inserem no mercado de trabalho. Entre 2012 e 2018 perdemos 1,1 milhões de postos de trabalho formal e surgiram 2,7 milhões de postos informais.
O mercado de trabalho se dividia, no início do período, em dois segmentos, sendo o formal ligeiramente maior que o informal (45,5 milhões e 44 milhões, respectivamente). Ao final dos seis anos, em 2018, continuamos a ter dois segmentos, mas agora o informal é ligeiramente maior que o formal (46,7 e 44,4, respectivamente).
As maiores perdas nas posições formais ocorreram com os empregados com carteira do setor privado (-1,5 milhões de empregos) e os maiores crescimentos nas posições informais ocorreram com os trabalhadores por conta própria (2,6 milhões) e com os empregadores (800 mil).
Os dados mostram que o tamanho da informalidade é ainda muito grande no Brasil e que o seu avanço pode ser atribuído à recessão dos anos 2015-2016, que reduziu o espaço da formalidade e levou muitos indivíduos para atividades informais como uma estratégia de sobrevivência.
Tabela 2
Evolução da posição na ocupação dos trabalhadores (em milhões)
PNAD/IBGE – 2012 a 2018 (1º Semestre)
Posição na ocupação | 2012 | 2013 | 2014 | 2015 | 2016 | 2017 | 2018 | Variação 2012/18 |
Empregados no Setor Público | 11,2 | 11,2 | 11,4 | 11,4 | 11,2 | 11,3 | 11,6 | 0,4 |
Empregados c/ Carteira – Setor Privado | 34,3 | 35,4 | 36,6 | 35,7 | 34,3 | 33,3 | 32,8 | -1,5 |
Subtotal – Trabalhadores formais | 45,5 | 46,5 | 48,0 | 47,1 | 45,5 | 44,6 | 44,4 | -1,1 |
Trabalhadores auxiliares da família | 2,8 | 2,8 | 2,6 | 2,6 | 2,1 | 2,2 | 2,1 | -0,7 |
Empregados s/ Carteira – Setor Privado | 11,1 | 10,8 | 10,4 | 10,1 | 10,1 | 10,7 | 11,0 | -0,1 |
Trabalhadores domésticos | 6,1 | 6,0 | 6,0 | 6,1 | 6,2 | 6,2 | 6,2 | 0,1 |
Empregadores | 3,6 | 3,7 | 3,8 | 4,0 | 3,9 | 4,2 | 4,4 | 0,8 |
Conta Própria | 20,4 | 20,9 | 21,3 | 22,2 | 22,5 | 22,7 | 23,0 | 2,6 |
Subtotal – Trab. majoritariamente informais | 44,0 | 44,2 | 44,1 | 45,0 | 44,9 | 46,0 | 46,7 | 2,7 |
Total | 89,5 | 90,8 | 92,1 | 92,1 | 90,4 | 90,6 | 91,2 | 1,7 |
Em síntese, a PNAD revela um ligeiro crescimento da informalidade, que pode ser atribuído à severa recessão cujos efeitos ainda estamos vivenciando.
Revela, também, que por trás da estagnação do mercado de trabalho continua em curso a terciarização da economia. Terciarização significa expansão do trabalho na circulação de bens e da produção de serviços (setor terciário), e retração do trabalho na produção de bens (setores primário e secundário).
O crescimento da informalidade deve ser revertido quando o nível de atividade se recuperar. Mas o segundo movimento tende a persistir e crescer. Na ausência de políticas apropriadas, teremos cada vez menos e