
A recontratação do empregado nos contratos por prazo determinado e indeterminado
Por Marcelo Mascaro Nascimento
O contrato de trabalho no que diz respeito à sua duração pode ser por prazo determinado ou indeterminado. A regra geral é que ele seja por prazo indeterminado e havendo silêncio quanto à sua duração prevalece a presunção por sua indeterminação. Já o contrato de trabalho por prazo determinado possui os momentos de início e término previamente fixados na contratação. São exemplos: i) o contrato de experiência, ii) o contrato para satisfazer serviço cuja natureza ou transitoriedade justifique a predeterminação do prazo e iii) o contrato para satisfazer atividades empresariais de caráter transitório, conforme previsto no artigo 443 da CLT.
Nos contratos por prazo indeterminado, a relação de emprego perdura no tempo e o seu objeto, a prestação do serviço pelo trabalhador, não possui, como regra geral, data ou condição previamente definida para encerrar. O empregado, em realidade, está à disposição do empregador, que por meio do poder diretivo, coordena o trabalho a ser executado pelo obreiro.
Daí decorre o princípio da continuidade, que expressa a conservação do contrato de trabalho, de modo a que ele permaneça vigente e produzindo efeitos por longa duração. Trata-se de um princípio protetivo ao trabalhador, já que permite a manutenção do contrato mesmo em momentos em que não há a execução do serviço.
Ademais, a continuidade cria regras impeditivas a que o empregado seja dispensado de forma efêmera e sem nenhuma garantia. Ao contrário do contrato de trabalho autônomo, em que o trabalhador pode ser contratado para executar tarefas específicas, cuja realização encerra o contrato, a continuidade da relação de emprego conserva o pacto após a execução de cada tarefa.
Alia-se a isso a assunção dos riscos da atividade econômica pelo empregador preconizada pelo artigo 2º da CLT. Uma vez que na relação de emprego o empregado permanece à disposição do empregador, momentos de escassez de serviço não afastam as obrigações contratuais do empregador. Exceção é o contrato de trabalho intermitente, que, por um lado, o trabalhador possui liberdade para aceitar ou não cada serviço e, por outro, o empregador apenas remunera os dias efetivamente trabalhados. Mas como regra geral, o empregador deve suportar todos os custos da atividade econômica, não podendo repassá-lo ao empregado, como por exemplo, suspendendo seu salário em períodos de dificuldade econômica ou de falta de serviço.
Assim, considerando o princípio da continuidade da relação de emprego o término do contrato de trabalho naquele por prazo determinado depende de ato jurídico, que poderá ser de iniciativa do empregador, do empregado ou de ambos, cada um com requisitos e consequências próprias. São exemplos desses atos jurídicos a dispensa sem justa causa, o pedido de demissão, a dispensa por justa causa e a extinção do contrato de trabalho por comum acordo.
O término do contrato de trabalho, por qualquer desses modos, extingue as obrigações das partes decorrentes da relação de emprego. Extinto o vínculo as partes encontram-se sem impedimento para exercer sua autonomia da vontade e celebrar novos contratos. A questão que se coloca é se uma vez extinto o vínculo entre empregado e empregador, as mesmas partes podem celebrar novo contrato de trabalho entre si.
Em princípio não há impedimento para que isso ocorra, já que a autonomia da vontade permite a livre contratação entre pessoas capazes. Não obstante, o Direito do Trabalho surge como um Direito de natureza protetiva ao empregado, em razão da sua maior fragilidade perante o empregador. A dependência econômica do empregado e a fácil substituição de mão de obra pelo empregador gera um desequilíbrio na capacidade de negociação entre as partes.
Diante dessa desigualdade a legislação trabalhista oferece uma série de medidas protetivas ao empregado e considera nulo qualquer ato que tenha como finalidade desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação desses preceitos, como previsto pelo artigo 9º da CLT.
Dessa forma, a readmissão de emprego pelo mesmo empregador é possível desde que isso não signifique qualquer espécie de fraude às normas trabalhistas. Por exemplo, se a dispensa sem justa causa do empregado se deu unicamente com a intenção de sua recontratação para o mesmo cargo mediante remuneração inferior ou redução de benefícios, está clara sua finalidade fraudulenta, em especial a violação ao princípio da inalterabilidade contratual lesiva ao trabalho, prevista no artigo 468 da CLT. Nesse caso, a dispensa seria considerada nula e seria reconhecida a unicidade contratual de todo o período, como pode ser observado na seguinte decisão de Turma do TST:
“UNICIDADE CONTRATUAL – RECONHECIMENTO – SÚMULA Nº 126 DO TST. No caso concreto, o Colegiado regional solucionou a questão referente ao reconhecimento da unicidade contratual, lastreado no contexto fático-probatório, inclusive na prova pericial, por verificar que a empresa adotou a conduta ilícita e reiterada de contratar seus ex-empregados em curto espaço de tempo, com salários inferiores e nas mesmas funções antes desempenhadas. Ultrapassar e infirmar a conclusão alcançada no aresto recorrido – existência de unicidade contratual – demandaria o reexame dos fatos e das provas presentes nos autos, o que é descabido na estreita via extraordinária. Incide a Súmula nº 126 do TST. Agravo de instrumento desprovido. (Processo : AIRR – 10435-84.2013.5.03.0061 Data de Julgamento: 21/03/2018, Relator Ministro: Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, 7ª Turma, Data de Publicação: DEJT 23/03/2018)”.
Assim, há presunção nesses casos de fraude à legislação trabalhista, cabendo ao empregador provar que a dispensa com posterior recontratação em patamar salarial inferior se deu por algum motivo extraordinário capaz de justificar a recontratação como se observa abaixo:
“UNICIDADE CONTRATUAL. RECONTRATAÇÃO DO EMPREGADO TRÊS MESES APÓS O DESLIGAMENTO DO EMPREGO, DECORRENTE DE PLANO DE SAÍDA INCENTIVADA. REDUÇÃO SALARIAL DO EMPREGADO NO SEGUNDO PERÍODO CONTRATUAL. FRAUDE À LEGISLAÇÃO TRABALHISTA. No caso, a controvérsia cinge-se em saber se a recontratação do reclamante três meses após o seu desligamento do emprego, decorrente de adesão ao plano de saída incentivada (PSI), configura fraude. Segundo o Regional, o reclamante foi recontratado pela empresa reclamada três meses após o seu desligamento, decorrente de adesão ao PSI, com fraude à legislação trabalhista, na medida em que resultou em redução salarial. Constata-se que o Regional aplicou uma presunção “hominis” em desfavor da reclamada, a quem caberia demonstrar alguma razão extraordinária apta a justificar a recontratação do empregado, em curto espaço de tempo, após a sua adesão ao PSI. Assim, como não o fez, entendeu-se fraudulenta a recontratação. Ressalta-se que para afastar essa premissa fática consignada no acórdão regional seria necessário rever a valoração do conjunto probatório, providência não permitida nesta instância recursal de natureza extraordinária, ante o óbice previsto na Súmula nº 126 do TST. Desse modo, a despeito da previsão normativa autorizando a recontratação do empregado, tendo em vista a fraude na utilização do plano de saída incentivada, com a supressão de direitos trabalhistas do reclamante, como asseverou o Regional, não há falar em violação do artigo 7º, inciso XXVI, da Constituição da República. Agravo de instrumento desprovido.” (AIRR-10912-94.2014.5.15.0140, 2ª Turma, Relator Ministro Jose Roberto Freire Pimenta, DEJT 01/03/2019).
Outra hipótese fraudulenta diz respeito à recontratação do empregado, após ter sido dispensado sem justa causa, em período inferior a 90 dias, ainda que recebendo salário igual ou superior. Nesse caso, o artigo 2º da Portaria nº 384/1992 do MTE considera a situação fraudulenta, pois haveria presunção de simulação para recebimento de seguro-desemprego e saque do FGTS.
Já havendo hipótese de extinção do contrato de trabalho por pedido de demissão do empregado ou por dispensa por justa causa, tal restrição não se aplica, uma vez que em e nenhuma das hipóteses há saque do FGTS ou recebimento de seguro-desemprego.
Importante destacar, porém, que com a pandemia da Covid-19, com vistas a facilitar a readmissão de trabalhadores dispensados nesse período, foi editada pela Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia a Portaria nº 16.655, de 14 de julho de 2020, com efeitos retroativos a partir de 20 de março de 2020, que determinou que durante o estado de calamidade pública provocado pela pandemia e que foi reconhecido até 31 de dezembro de 2021 não se presumiria fraudulenta a rescisão de contrato de trabalho sem justa causa seguida de recontratação dentro dos noventa dias subsequentes à data em que formalmente a rescisão se operou, desde que mantidos os mesmos termos do contrato rescindido.
Ainda, no referido período considerado de calamidade pública, havendo dispensa sem justa causa e recontratação do empregado após 90 dias e sem redução salarial ou de direitos, o ato jurídico deve ser considerado lícito e válido, não havendo unicidade contratual.
Tratando-se, porém, de contrato por prazo determinado, conforme o artigo 452 da CLT, a celebração de novo contrato por prazo determinado deve observar o prazo mínimo de seis meses, exceto se o término do primeiro decorreu da execução de serviços especializados ou da realização de certos acontecimentos.
Na hipótese de o contrato ser de experiência, somente poderá ocorrer nova contratação nessa modalidade se a função a ser exercida pelo trabalhador for distinta daquela do primeiro contrato.
Diante disso, em suma, a recontratação de empregado após a extinção do contrato de trabalho é possível desde que sejam observadas algumas regras. No caso de contrato por prazo indeterminado, a recontratação em patamar salarial inferior ou mediante redução de direitos é presumida como fraudulenta, ensejando a unicidade contratual. Além disso, se a extinção se deu por dispensa sem justa causa, a nova contratação somente será permitida após decorrido o prazo de 90 dias.
Não existe, contudo, um prazo definido pela jurisprudência para que a recontratação nesses casos não seja considerada fraudulenta. Cada caso concreto deverá ser analisado com suas especificidades. Não obstante, é certo que quanto maior o lapso temporal entre a extinção do contrato e a recontratação, maior será a força do argumento pela ausência de fraude.Já nas hipóteses de nova contratação em contratos por prazo determinado deve ser respeitado o intervalo de seis meses, salvo se o término do primeiro decorreu da execução de serviços especializados ou da realização de certos acontecimentos.