artigos - 07/05/2024

Ensaio sobre o conceito de condições de trabalho

Amauri Mascaro Nascimento.

1. Propedêutica.

Há conceitos que à primeira vista parecem simples, mas na realidade não o são , com o ocorre neste caso no qual se procura o conceito de condições de trabalho, expressão muito usada no direito do trabalho, porém não conceituada.Simples, também não é, a enumeração das mesmas.

Cabanellas em Derecho de los Riesgos de Trabajo no qual o autor ao tratar do tema sublinha a necessidade de proteções especiais preventivas , relaciona as seguintes condições de trabalho: locais de trabalho e as condições que devem reunir para que cumpram seus objetivos, habilitação dos locais de trabalho, fatores ambientais, iluminação, calefação, umidade, ventilação, dormitórios, restaurantes, vestuários, serviços sanitários terminando com noções gerais e bem estar dos trabalhadores. Isto é a facilidade que deve ser promovida para trabalhador quanto aos locais para que ele possa da melhor maneira possível e com a eliminação do maior numero de riscos cumprirem as suas tarefas.

Trata-se, a meu ver, de uma preocupação voltada para o Ambiente de trabalho e não para as condições de trabalho no seu sentido jurídico.

O mesmo autor  em Histoire et politique du droit du travail faz referencias ao tema nele incluído as condições de vida do proletariado e especificamente as condições de trabalho mencionando às 13 horas efetivas por dia, as condições de salário muito baixo, as condições de vida porque os operários viviam em função da fábrica numa atividade exaustiva, as condições intelectuais e morais, o alcoolismo, a prostituição, tudo acompanhado de uma critica aos chefes e manufaturas da época num contexto que já foi superado pelo tempo embora numa ou noutra situação ainda tenha deixado alguns traços na sua existência, felizmente em desaparecimento. 

Aqui, Cabanelas avalia a situação na qual o trabalho é desenvolvido, portento um segundo aspecto do tema o que nos permite desde logo verificar que existem diversos sentidos dessa expresssão.

Cesarino começa dizendo do que é nesta parte do direito do trabalho que, talvez melhor que em qualquer outra, se nota o caráter regulamentar e profundamente casuístico da legislação do trabalho, que deve considerar uma infinidade de pormenores, de onde resulta, em grande parte, o caráter de complexidade de que se reveste. Ela se ocupa principalmente da duração do trabalho em geral em certas profissões especializadas que ela regulamenta, da higiene e da segurança do trabalho e do trabalho de menores e mulheres.A postura de Cesarino parece mais normativa na medida em que se volta mais para outro  aspecto,o da legislação.

 Vê-se, desde logo, que há mais de um sentido que pode ser atribuído à referida expressão.Portanto , estamos diante de uma expressão polissêmica.

Muito próximos são o estudo da perspectiva e o estudo dos conceitos.

Aquele, como já fiz (Iniciação do Direito do Trabalho e Direito Contemporâneo do Trabalho) é uma análise de diretrizes aceitáveis.

Por ser polissêmica comportando mais de um sentido a expressão condições de trabalho, em princípio, poder ser entendida na dimensão de :

–  sistema de trabalho num determinado período da história do trabalho. Ex.: condições de trabalho do proletariado, condições de trabalho no corporativismo etc.

– de relação de emprego como desenvolvimento do contrato individual de trabalho; a relação de emprego,como sabemos,  é uma situação objetiva pouco importando os aspectos subjetivos da pactuação;

     – como situação quesignifica a forma em que uma realidade material está em um lugar (Kant), como um estar-em para mostrar que o homem está em um espaço no mundo, na história, em uma estrutura social na qual atualiza a própria existência, portanto o mundo que o circunda e do qual recebe, também, influxos para a sua própria atualização é essa forma humana que a filosofia contemporânea denomina situação, palavra  bastante utilizada no direito do trabalho de Portugal para designar a natureza do vínculo entre o empregado e o empregador (Maria Palma Ramalho e Menezes Cordeiro), a forma em que uma realidade material está em um lugar , um estar-en para mostrar que o homem está em um espaço, no mundo, na história, em uma estrutura social no qual atualiza a própria  existência, portanto, o mundo que o circunda do qual recebe, também, influxos para a sua própria atualização; essa é forma humana que a filosofia contemporânea denomina situação

–   cláusulas dos contratos de trabalho , assim com existem as cláusulas dos contratos de  direito civil com uma diferença: o direito civil é documental, nele o que está escrito no contrato faz lei entre as partes(pacta sunt servanda) salvo exceções (cláusula sic rebus sic stantibus) enquanto no direito do trabalho embora sendo possível também fazer essa afirmação, não é possível ficar só nela pois nem sempre é necessário um contrato escrito, pois basta o contrato verbal ou mesmo tácito ou ainda a relação de emprego( CLT art.442) e se houver confronto entre o escrito no documento e o concreto no dia a dia no trabalho da empresa,  prevalecerá a realidade tal como provada.

      –     condições de trabalho como os atos praticados pelo empregado no desenvolvimento da sua atividade; abra-se um parêntesis para lembrar que contrato de trabalho e relação de emprego são figuras convergentes para o mesmo fim da criação de direitos e deveres recíprocos entre os sujeitos do vínculo uma vez que a situação objetiva que é denominada relação de emprego tem os efeitos equiparados aos do contrato que é o ajuste de vontades.

     Nesse particular convém dedicar um pouco mais de atenção a esse ponto..

      Está claro para o direito do trabalho que nem todas as condições de trabalho são iguais sob o aspecto da hiperatividade, porque umas são mais intensas e de maior grau, e outras são menos intensas e de menor grau.

     Essa dupla área em que a relação de emprego se desenvolve é denominada pelos juristas de modos diferentes. Há uma a  área mais intensa e hipergarantista. Para alguns o nome é Direito Tutelar do Trabalho. Para outros, Conteúdo Mínimo do Contrato de Trabalho. Outros ainda a identificam como Direitos Fundamentais do Trabalhador. Outros mais falam em Direitos Indisponíveis. Não falta quem fale em Cláusulas Pétreas. E assim por diante. Nenhuma dessas denominações, no entanto, atingiu a unanimidade e a profundidade que o tema exige.

     Essas designações são às vezes demasiadas incursionando em terreno que não é o que estamos vendo, em outras vezes são menores do que a amplitude que o tema exige.

     Outras propostas existem, das quais seguem as principais.

     Direito tutelar do trabalho dá a idéia de que todas as condições de trabalho são tuteladas pelo direito, quando é sabido que algumas  podem resultar do contrato expresso ou tácito sem nenhuma tutela legal específica (CLT, art. 444)em um sistema legal como o do Brasil, no qual o sistema legal permite que as partes estipulem livremente as condições de trabalho, respeitadas as normas de proteção ao trabalho.

      Conteúdo mínimo do contrato de trabalho é designação insuficiente para abranger todas as condições de trabalho porque estas existem também acima dos mínimos legais e, às vezes, quando a lei autoriza, abaixo dos mesmos (CF, art. 7º, VI).

      Direitos fundamentais do trabalhador são muito mais que condições de trabalho, porque são direitos que se situam num patamar constitucional, e as condições de trabalho localizam-se também abaixo desse patamar.

      Direitos indisponíveis são aqueles dos quais as partes não podem abrir mão enquanto condições de trabalho; em muitos casos, são também as determinadas pelas próprias partes, como horários de trabalho, que podem ser, observados os limites legais, pelas mesmas fixados e alterados.

      Cláusulas pétreas, no sentido do direito brasileiro, são os direitos sociais relacionados pela Constituição (CF, art. 6º), mas não os direitos derivados das mesmas.

  É difícil compatibilizar essas noções com o tema.

2. O núcleo e as esferas periféricas .

O conceito de condições de trabalho, polissêmico que é,tem um núcleo e esferas periféricas.

O núcleo  é duplo.

Compreende dois níveis que se entrelaçam, a realidade dos  atos praticados pelos sujeitos do vínculo de trabalho e o repertório jurídico previsto no ordenamento normativos e nesse sentido é possível falar em  condições de trabalho como o desenvolvimento da relação de emprego e condições de trabalho como os direitos e deveres previstos nas normas e que nem sempre coincidem com  o que é praticado.

Assim, quando se fel em condições de trabalho praticadas pela empresa X não é o mesmo que condições de trabalho previstas na lei Y, pois naquele plano o que se cogita é da atividade tal como está sendo ou foi realizada e que pode ou não ser igual aos direitos que o empregado tem segundo a lei, as convenções coletivas ou o contrato.

Dentre os  da CLT que aludem à expressão   assinalem-se como mais expressivos dispositivos o Capítulo I do Título III que usa a utiliza nos seguintes termos: “das disposições especiais sobre duração e condições de trabalho” (arts. 224 a 361). Acrescentem-se no texto sobre anotações na carteira de trabalho  das “condições especiais, se houver”(art. 29).

Não se confunda, no entanto, anotações da carteira com condições de trabalho porque aquelas são mais amplas e abrangem  informações como data de nascimento do empregado, residência etc. Assim, condições de trabalho são um tipo de informações que devem ser anotadas na carteira de trabalho. Nem todas ,mas as principais..

 As anotações da carteira têm, como sabemos, finalidade probatória das condições de trabalho. Não é o único, mas apenas um dos meios  de prova e de valor relativo porque geram uma presunção ris tantum uma vez que podem ser  infirmadas por outras provas contrárias. As condições de trabalho são a substância de que se valem os interessados para promoverem os registros competentes Esses registros devem ser fiéis sob pena de configuração do crime de falsidade ideológica.

O art. 611 da CLT ao estabelecer o conteúdo das convenções e acordos coletivos incluiu entre eles as “condições de trabalho” ao dispor que “convenção coletiva de trabalho é o acordo de caráter normativo pelo qual dois ou mais sindicatos  representativos  de categorias econômica e profissional estipulam  condições de trabalho aplicáveis no âmbito das respectivas s representações às relações individuais de trabalho.” 

Na mesma esfera das negociações coletivas, a CLT, art.613, enumera o conteúdo obrigatório das convenções e acordos coletivos, no qual se incluem as “condições ajustadas  para reger as relações individuais de trabalho durante a sua vigência “.

O direito brasileiro não tem uma definição de condições e trabalho. E não é fácil essa definição tendo em conta a variedade e tipos de condições de trabalho previstas em nosso ordenamento.

Ainda a CLT ( art. 620) declara que as condições estabelecidas em Convenção, quando mais favoráveis prevalecem sobre as estipuladas em Acordo.

Também nas sentenças normativas a expressão condições de trabalho é usada. A CLT, o art., 868 sobre extensão das decisões  normativas à mesma  se refere para declarar que em caso de dissídio coletivo  que tenha por objeto  novas condições de trabalho é possível, em determinadas circunstâncias a sua extensão.

Como se vê, condições de trabalho é forma de linguagem incorporada em nosso ordenamento jurídico.

Conclui-se que a lei como disse, não tem um conceito, mas usa a expressão.

3.No núcleo está o  repertório jurídico dos direitos do empregado.

No plano normativo o direito do empregado provém das normas jurídicas e estas se expressam de várias formas como a lei, as convenções coletivas, os regulamentos de empresa e o contrato individual.

É o caso do salário. É previsto no ordenamento jurídico e estipulado pelas partes.

Aceita a premissa de que há afastamentos do empregado durante os quais imperativos sociais indicam a necessidade de uma formulação jurídica que dê respaldo para a continuidade das percepções econômicas do mesmo, viabilizamse, em tese, duas hipóteses tendo em vista a fonte da qual a manutenção desses ingressos deve emanar, os órgãos da previdência ou o empregador.

Em alguns casos transfere-se a responsabilidade dos pagamentos para a seguridade social, em outros para o empregador, em outros ainda quem suporta os ônus ora é o empregador ora o empregado.

Férias são condições de trabalho?

No sentido jurídico sim por ser um componente obrigatório dos deveres do empregador e dos direitos do empregado.

No sentido sociológico é o descanso, portanto a paralisação do trabalho durante certa parte do ano. Assim, no plano do real as férias não poderiam enquadrar-se como condições de trabalho, mas sim como exercício de um direito, direito a um descanso anual e com isso a sua inclusão no tema se dá pelo aspecto jurídico porque todas as leis asseguram aos empregados  depois de um determinado tempo de serviço no ano, um número determinado de dias de inatividade para uso do tempo como o empregado desejar, para descanso reparador das suas condições físicas e morais.

Logo, férias, pela dimensão jurídica do conceito de condições de trabalho, inserem-se nas mesmas como expressão de uma garantia legal ou contratual de um determinado número de dias por ano nos quais o empregado sem trabalhar continuará com direito às percepções econômicas.

Os mesmos critérios podem ser aplicados ao repouso semanal remunerado quanto à sua natureza ou não de condição de trabalho e a resposta é sim sob o aspecto jurídico e não sob o aspecto real porque também no descanso semanal não há atividade do trabalhador. A lei estabelece que haja necessidade de um descanso semanal após cada seis dias de trabalho.

A proteção de ordem moral também integra as condições do trabalho?

Sim, porque o ser humano que trabalha não é diferente dos demais de modo que se a estes é reconhecido direito a reparações por agressões e assédios de ordem moral nada justificaria tratamento diferente do trabalhador como pessoa que é e como cidadão que não deixa de ser quando entra nas instalações da empresa para trabalhar.

Nesse ponto o direito do trabalho vem crescendo muito devagar. Vale-se, ainda, em boa parte, do direito civil. No entanto já tem caminhos próprios que são aqueles dos direitos de personalidade seguidos pelo atual Código de Trabalho de Portugal.

4.Aspectos periféricos do conceito.

    Condições de trabalho pode também se utilizada para expressar um período da história.

Quando se fala em condições de trabalho do proletariado na Revolução Industrial do século XVIII  o que se quer dizer é uma característica do trabalho  daquela época com todos os problemas que enfrentou e a precariedade de que se revestiu. Assim também quando se fala em condições de trabalho da Idade Média o que se diz é sobre o sistema feudal e a situação do trabalhador agregado ao solo perante o vassalo que lhe cobrava impostos que eram extorquidos.

De outra maneira quando se pensa em condições de trabalho na Revolução Francesa de 1789  o que se quer dizer é o sopro de liberdade do individualismo do qual surgiu a concepção liberal do Estrado omissivoe da não interferência do estado na situação do trabalho que existia.

Exemplifiquem-se com condições de trabalho do proletariado, condições de trabalho no corporativismo, condições de trabalho ma Idade Média, condições de trabalho na América Latina etc.

Quando se fala em condições precárias de trabalho o que se está fazendo é uma avaliação da qualidade do trabalho tal como é tratado numa época, num sistema, num País  ou numa empresa.

Trabalho precário ou degradante é um juízo estimativo da qualidade do trabalho.

Tem-se como tal o trabalho prestado em condições subumanas como o retratado na novela de televisão Salve Jorge, da Globo, que nos mostra uma das suas formas contemporâneas, a escravidão para a prostituição internacional.

       A OIT ressalta que as formas contemporâneas de trabalho forçado exigem urgentemente mais pesquisas e atenção, para preparar o terreno para indicadores e avaliações mais precisos e com perspectiva de gênero como base para uma definição política e ação futura.

      No  primeiro capítulo do Relatório Global de 2001 já consta advertência:

      Ao se falar de trabalho forçado, é preciso ter muito cuidado com a terminologia utilizada. É comum os meios de comunicação a ele se referirem como “escravidão moderna”, associando o conceito a condições abusivas de trabalho ou salário muito baixos.

     Trabalho forçado é expressão jurídica, mas também um fenômeno econômico. Não será possível “respeitar, promover e tornar realidade” o princípio da eliminação de todas as formas de trabalho forçado ou compulsório sem se conhecer o exato significado dessa expressão. Sua definição completa contempla exclusões, mas a idéia básica é bastante clara( v. OIT  Convenção 29, de 1930, artigo 2º ).

     O contrato de trabalho é um negócio jurídico bilateral.O fato de a lei interferir nesse vínculo não impede o seu enquadramento como negócio jurídico porque também no direito civil é assim. 

5. As condições de trabalho podem ser alteradas.

As alterações nas condições de trabalho seguem um dos dois princípios, o da modificabilidade ou da imodificabilidade ,este,segundo o qual nenhuma condição de trabalho pode ser modificada unilateralmente pelo empregador, regra contida no direito do Brasil cuja lei declara que nos contratos individuais do trabalho só é lista a alteração das respectivas condições com muito consentimento e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de imunidade da clausula infringente desta garantia (CLT Art. 468) .

Essa regra impeditiva da alteração não-consensual é forte intervenção na autonomia da vontade, porém necessária, impede até mesmo modificação bilateral consentida pelo trabalhador desde que prejudicial caso que este pode pleitear a respectiva anulação do ato danoso e a restituição do status quo ante.

A imodificabilidade unilateral é considerada pela doutrina um avanço no sentido protecionista, mas contraria a realidade perante a qual o desenvolvimento da relação de emprego no tempo se vê diante de diversas situações novas advindas de fatores que não são secundárias como a alteração da tecnologia da empresa, a situação econômica do pais e da empresa, as próprias condições do próprio trabalhador que nem sempre têm mantido a sua aptidão inicial para a função que exerce, acontecimentos independentes da vontade das partes como as que vêm de tragédias da natureza, etc.

Há uma idéia que não pode ser recusada, nenhum empregado  volitivamente quer a modificação de condições de trabalho quando contrario a seus interesses. Mas não se trata aqui de saber apenas o que as partes têm interesse, mas sim do que a vida real impõe.

Excepcionalmente, ainda que assim o seja, o jus variandi é aceito pela dogmática jurídica dentro de limites que podem ser mais ou menos restritos, mas que evidentemente se alinham entre os instrumentos utilizados pelo nosso direito. O jus variandi desenvolveu-se na doutrina italiana como decorrência do poder diretivo reconhecido do empregador e fundamenta alterações relativas à função, ao salário, ao local da prestação de serviços e outras em relação às quais o empregador pode sim promover modificações desde que justificadas e irrecusáveis.

Há empregados promovidos para cargos de confiança, mas que uma vez  cessada a confiança a empresa os reconduz ao cargo anterior ao de confiança  com prejuízo das vantagens que obteve durante a investidura maior. Como se vê não há como recusar o jus variandi, mas as leis dificilmente o fazem. Acredito que até a forma de pagamento esteja sob o manto do jus variandi. O empregador é forçado às vezes a mudar o salário, não só no seu valor como na sua forma, isso é sabido. A lei brasileira permite a redução geral de salários por negociação coletiva (Constituição Federal Art. 7, III).

   O empregado pode ser transferido para outra localidade para necessidade da empresa. Veja que há varias questões nas quais as condições de trabalho podem ser mudadas pelo empregador mesmo contrariando interesses do trabalhador. Isto deve influir no conceito de condições de trabalho para afastar a idéia de que são irremovíveis, absolutas e indisponíveis, que na realidade não são, nem durante o vinculo, muito menos depois do encerramento do vinculo quando são discutidas e sobre as quais incidem conciliações que são atos compromissórios entre as partes para um acertamento indenizatório da sua situação.

Assim ao procurar a noção de condições de trabalho é conveniente aduzir esse outro elemento: a mutabilidade como exceção embora a imutabilidade como regra.

6.Outros aspectos.

A idéia de condições de trabalho nos põe diante de alguns elementos comuns a sua configuração: local, jornada, descanso e salário.

Quando se pensa em relação de emprego o primeiro aspecto que nos vem à mente é de que ela é um fato que se desenvolve num local físico.

Ressalte que hoje isso tem mudado muito com o tele trabalho, mas a regra geral continua a mesma. O empregado para trabalhar o faz no local que é o estabelecimento do empregador embora possa fazê-lo, o que já é mais raro, na sua própria residência. Porem o local sempre existira.

Uma das condições de trabalho é o local de trabalho.

Seria possível condições de trabalho sem local em que sejam prestadas? Por mais intelectualizado que seja o serviço sempre haverá um local. Ainda que se trate de um professor escrevendo um livro e o fazendo por microfone para que depois seja editado por escrito, ao escrever as suas idéias foram desenvolvidos num local que pode ter sido até seu próprio escritório. Porem o local sempre existirá. Por mais intermitente que seja o contrato individual de trabalho não há como se desenvolver sem um local ainda que nele o empregado permaneça a disposição do empregador aguardando de sobreaviso uma chamada. Todavia, um local haverá sempre. Dessa maneira a conclusão a que chego nesse ponto é que o local é um elemento inerente às condições de trabalho.

Não há dúvida de que a primeira condição que o empregador esta obrigado a cumprir é assegurar aos trabalhadores o desenvolvimento das suas atividades em ambiente moral com segurança e higiene. Para esse fim, bem como para outros, é que surgiu o direito do trabalho inconfundível com o direito de seguridade social, este último integrado pela previdência, pela assistência social e pela infortunística. São setores separados e inconfundíveis, cada qual com legislação, fiscalização e jurisdição próprias.

O meio ambiente do trabalho é  o complexo máquina-trabalho: as edificações do estabelecimento, equipamentos de proteção individual, iluminação, conforto térmico, instalações elétricas, condições de salubridade ou insalubridade, de periculosidade ou não, meios de prevenção a fadiga, outras medidas de proteção ao trabalhador, jornadas de trabalho e horas extras, intervalo, descansos, férias, movimentação, armazenagem e manuseio de materiais que formam o conjunto de condições do trabalho, etc.

A matéria é trabalhista porque o meio ambiente do trabalho é a relação entre o homem e o fator técnico. Assim, há uma série de efeitos jurídicos que resultam do meio ambiente do trabalho em especial as medidas pertinentes a infortunística. Os acidentes do trabalho são comuns porque todo trabalho apresenta um risco que lhe é natural. Assim o direito construiu uma teoria da responsabilidade objetiva pela qual havendo o acidente as reparações independente de saber se o empregado ou empregador tiveram culpa ou não. Essa responsabilidade objetiva veio do direito civil para o direito do trabalho e hoje está consagrada nas leis de seguridade social.

As medidas de medicina do trabalho não se confundem com as de segurança do trabalho, pois aquelas são as que procuram como parte da medicina do trabalho a adotar medidas restritivas e preventivas além das curativas enquanto que a segurança do trabalho é mais uma questão de engenharia, de locais adequadamente construídos nos quais o trabalho possa ser bem executado e as exigências legais e administrativas, essas em grande parte, que visam cercar o empregado de uma blindagem contra os possíveis riscos que sofrerá no exercício da sua atividade.

A segurança do trabalho é o conjunto de medidas que versa sobre condições especificas de instalação do estabelecimento e de suas máquinas visando à garantia do trabalhador contra a natural exposição aos riscos inerentes a prática da atividade profissional. Não se destina, portanto aos aspectos sanitários, mas os complementa uma vez que a higiene pressupõe instalações condignas, segundo determinadas regras básicas de construção e ter disposição dos bens.

A proteção jurídica a saúde do trabalho é da maior importância com o direito do trabalho porque diz respeito não apenas a qualidade de vida do trabalhador, mas também sua integridade física e bem estar, ressaltando, corretamente, a doutrina, que o meio ambiente do trabalho está inserida no meio ambiente geral de modo que é impossível ter qualidade de vida sem ter qualidade de trabalho já que o homem passa grande parte da sua vida no ambiente de trabalho. O direito do trabalho tem ultimamente valorizado ainda mais essas questões. Assim as relaciona com um principio maior: o principio da proteção a vida e a dignidade do trabalhador.

Não há exagero nessa relação entre os temas de ambiente do trabalho e o principio de proteção a vida do trabalhador porque na verdade o que se objetiva com os meios que são exercitados na situação de trabalho para defender o bem acima mencionado fazem com que haja uma relação de causa e efeito.

Por que são exigidas medidas de medicina e segurança no direito do trabalho? Para que tenha sua vida protegida.

É sabido que algumas atividades afetam a integridade física do empregado como a de produtos químicos. Lençóis freáticos sobre os quais ele trabalha numa indústria química podem causar-lhe um mal que não tem como ser reparado. Meio ambiente do trabalho não é algo diferente do conjunto de condições de segurança e medicina do trabalho. As duas expressões, na verdade, tratam de uma só e mesma realidade. A complexidade e extensão da matéria levam os Estados a discipliná-la pelo meio de normas regulamentadores. Nada impede que entre sindicatos e empresas sejam pactuados acordos coletivos de trabalho respeitadas as garantias mínimas fixadas em lei.

As empresas são obrigadas a cumprir essas normas, promover as medidas necessárias para proteção à saúde e segurança do trabalhador, fornecer equipamento de proteção individual, agir em caráter preventivo, cuidar para o estado e conservação das suas instalações, da iluminação, do conforto térmico, das instalações elétricas, das máquinas e equipamentos e cuidar especialmente das atividades exercidas em ambientes insalubres ou com riscos de explosões ou de lesões.

Os trabalhadores, por sua vez, são obrigados a cumprir as ordens da empresa, configurando ato faltoso a sua recusa injustificada em obedecer às normas gerais e pessoais como as determinações para o uso de equipamentos de proteção.

O acompanhamento da saúde do empregado é obrigação do empregador.A lei prevê exames médicos periódicos e obriga as empresas a se instrumentalizarem para tal fim. A empresa é obrigada a ter ambulatórios médicos ou quando não possível, ter um médico que possa atender aos empregados, a fornecer gratuitamente os equipamentos de proteção individual adequados ao risco em perfeito estado de conservação e funcionamento, a ter os equipamentos de primeiros socorros para o atendimento imediato dos empregados que se acidentam no serviço, enfim todo material necessário a prestação dos serviços de primeiros socorros médicos.

Os institutos de apoio ao trabalhador também atuam no caso. Fiscalizam e recebem notificações de doenças profissionais das produzidas em virtude das condições especiais de trabalho e dentro das empresas existem comissões que no Brasil se chamam CIPA – Comissão Interna de Prevenção de Acidentes – que são serviços especializados em engenharia de segurança e medicina do trabalho  dentro de um programa de prevenção de riscos ambientais do qual participam os trabalhadores além do empregador.

O local de trabalho, que o professor de Portugal, Menezes Leitão (Direito do Trabalho) denomina sítio físico onde o trabalhador realiza habitualmente a sua atividade e onde se encontra, não teve ainda a amplitude que merece nos estudos do direito do trabalho, com as ressalvas como a acima feita, uma vez que envolve diversos aspectos das condições de trabalho.

Quando se faz um contrato de trabalho sempre há designação de um local ainda que seja variável. Isto não altera o problema. O local sempre haverá. Um vendedor externo também tem o seu local de trabalho. Às vezes presta serviços em zona fechada e outras vezes sem essa limitação.

Importa ao estudo do tema a qualificação do próprio contrato porque determina os seus aspectos físicos fundamentais, um dos seus pressupostos básicos, sem o qual os demais poderiam até mesmo desconfigurar relações de emprego.

Ressalte-se, no entanto, que no direito do trabalho contemporâneo o local de trabalho, para o fim de configurar ou não relação de  emprego, já não tem a mesma significação. Veja-se o exemplo do teletrabalho no qual a atividade do empregado é exercida a distância, mas ainda assim haverá o local à distância em que ele se situa para exercício dos seus deveres funcionais.

O local de trabalho é importante também para determinar a normativa aplicável à relação de emprego. Não nos referimos à lei, mas sim às convenções coletivas de trabalho. O enquadramento do empregado numa categoria sindical depende do local de trabalho. Exige a verificação de qual é o sindicato que atua na base territorial respectiva e correspondente ao local de trabalho. Dessa solução é que resultará o instrumento normativo sindical aplicável ao empregado.

Como se vê, o local projeta reflexos tanto de direito individual como de direito coletivo do trabalho, aqueles que são os pertinentes ao trabalhador, estes a uma perspectiva mais ampla, categorial, e que também determinará qual é a categoria a que pertence o empregado.

O local de trabalho pode ser determinado ou indeterminado, aquele quando expressamente previsto no contrato individual de trabalho, este quando não previsto, mas existirá cabendo indutivamente dos fatos a conclusão a respeito de qual é esse local. Outra hipótese é do local de trabalho alternativo que é aquele em que o empregado exerce as suas funções sempre o modificando. É o caso de pessoal de manutenção de elevadores.

Em situações nas quais há dúvidas a respeito do local de trabalho o melhor critério de solução é a razoabilidade que de certo modo atenda `as exigências da gestão empresarial e que não exponha o empregado a uma situação de indeterminabilidade que possa afetar a substância do contrato.

Outro aspecto desse mesmo estudo é o da mobilidade geográfica do empregado. Em outras palavras é a questão da transferência do empregado de um para outro local ou de localidade de trabalho.

As necessidades empresariais em determinadas situações exigem um empregado que se desloque, que seja transferido. Existem dois tipos de transferências, as definitivas e as provisórias, aquelas interferindo fundamentalmente no modo de vida do empregado o que justifica que dependam da sua anuência, estas, pela sua transitoriedade são as que atendem ao interesse do empregador. Mas podem, excepcionalmente, atender a um propósito do empregado. A regra geral é que atendam a uma necessidade da empresa e portanto devem estar condicionadas a autorizantes especificas da lei.  A principal é a necessidade imperiosa da empresa. Deve ser justificada com a demonstração de que realmente é necessária a presença do empregado em outro local do trabalho por um imperativo do exercício da atividade econômica.

Outra hipótese de transferência é por força da mudança do estabelecimento. É claro que quando isso ocorre à empresa se transferindo para outro lugar, os empregados têm que acompanhá-la. Se o recusam, devem ter uma razão. Uma justificativa. Caso se recusem injustificadamente não há outra alternativa a não ser a rescisão do contrato de trabalho. E essas justificativas dos empregados podem ser muitas porque como chefes de família têm filhos que estão cursando estabelecimentos de ensino. Seria um problema para a família a sua desunião como seria também difícil a acomodação da situação de toda a família em função da transferência do local de trabalho do pai. Esses casos têm que ser resolvidos com base no já mencionado princípio da razoabilidade. Cada caso concreto tem a sua peculiaridade que deve ser considerada e deve servir para uma solução justa e que não prejudique o empregado muito menos causem embaraços ao empregador.

O tempo para o trabalho ( a jornada ) é outro elemento integrante das condições de trabalho. Se há trabalho ele toma um tempo de quem vai prestá-lo. Logo é impossível trabalhar sem dedicar um tempo a esse trabalho.

Dessa forma a jornada ou se quiser o horário – embora os dois conceitos não sejam exatamente iguais – é algo que integra a configuração que estamos construindo. Para trabalhar eu tenho que dedicar um tempo a esse trabalho. Esse tempo pode ser até determinado por mim ou autodeterminado, mas sempre haverá. Não é o fato de eu marcar um cartão ou um livro de ponto, por meios eletrônicos ou outros que altera o quadro, muito menos vai modificar o fato de eu ser liberado dessa obrigação como também não modificará a solução da questão a circunstância de eu estar desobrigado por um empregador de comparecimento no estabelecimento.

Hoje há crescentes atividades das quais o empregador requer mais os resultados do empregado sem se preocupar com o local e o tempo onde eles são desenvolvidos. Porém o desenvolvimento do trabalho para obtenção dos resultados é inafastável. Se for assim é a minha conclusão é de que o horário e a jornada são o segundo elemento da configuração das condições de trabalho.

O terceiro elemento pode à primeira vista parecer contraditório: o descanso. Não há contradição nenhuma. Se para trabalhar eu tenho que dedicar um tempo da minha vida, se ao fazê-lo eu me voltar integralmente para o trabalho como ser humano perde a minha dimensão humanística.

O trabalho é correlato ao descanso. Até no trabalho caseiro é assim. Trabalha-se e se descansa. Assim, o a atividade do emprestado  pressupõe sempre períodos de descanso, maiores ou menores, porque há descansos diários chamados intervalos, descansos semanais denominados repousos semanais e descansos anuais que tem o nome de férias.

Essas figuras integram o direito das condições do trabalho porque são uma necessária pausa nas atividades de alguém para recompor as energias e voltar em condições razoáveis a vocacioná-las novamente para produção dos resultados exigidos pelo empregador.

Outro  elemento é  o risco.

  Todo trabalho expõe quem o executa a um potencial risco o que pode ser notado até em nossas tarefas domésticas, Quem prega um prego na parede para assentar um quadro pode  atingir um dedo e sair ferido.

É a razão pela qual o Direito construiu um setor denominado infortunística ou direito dos acidentes de trabalho e doenças profissionais, dos mais atuantes e movimentados como revelam as estatísticas a respeito do número de acidentes de trabalho durante um certo período em um determinado país ou em um setor de atividade da força produtiva de um país.

O termo mobilidade da mão de obra tem sido utilizado com muita frequência no sistema europeu para designar as transferências de funções ou multifuncionalidade do empregado, e de local de trabalho também, e esse é um sentido válido também para o direito brasileiro.

Á título de conclusão

Depois dessa análise é necessário chegar a alguma conclusão sobre o objetivo da mesma que é o conceito de condições de trabalho.

Trata-se de um conceito inconcluso apesar da utilização frequente da expressão que é polissêmica

Tem um núcleo conceitual duplo, sociológico que é o  fazer ou não fazer e uma previsão normativa que regulamenta as relações jurídicas daqueles que figuram como sujeitos do contrato de trabalho e ao seu redor há esferas periféricas correlacionadas com o núcleo interior.

Diante da  existência de mais de um significado do vocábulo,  por se tratar uma expressão que pode ser tomada em mais de um significado depende de  outras palavras para que se tenha o  sentido em que está sendo usada, se no sentido de trabalho num dado momento da história e em determinado lugar, se  dos direitos dos trabalhadores num repertório jurídico, se  da qualidade  do trabalho prestado, se da situação objetiva  do trabalho ou se condições de trabalho são o que consta das normas jurídicas.

Diante disso, não há como confinar a expressão a um único significado mas a diversos deles .

No tempo,  tem um  sentido  de localização de um período da história como condições de trabalho na Idade Média. No espaço é outro o sentido, é o de determinação de uma área geográfica como condições de trabalho na Índia.No nível normativo é o conceito que tem como base as normas jurídicas o que é raro.No plano sociológico é o conceito que provém  da realidade da atividade humana como as condições de trabalho numa  empresa. 

Observa-se, também, que a expressão designa o próprio trabalho  caso em que  o vocábulo condiçõesdiferentemente do seu sentido no direito civil mostra um aspecto do trabalho.



Dr. Marcelo Mascaro

Advogado do Trabalho, CTO

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