artigos - 13/06/2024

Palavra do Professor

Amauri Mascaro Nascimento

PARECER

XXXXXXXX instituiu um sistema de saque-cartão e quer uma avaliação sobre a sua compatibilidade com a legislação trabalhista:

Descreve-o assim:

“O pagamento feito por meio de cartão de saque, através da empresa YYYYYY (terceira), é feito quando um funcionário da XXXXXXX é premiado.

Este prêmio pode ser dado àquele funcionário que teve uma idéia de um projeto que beneficia a empresa e que não faz parte do trabalho cotidiano do funcionário ou então, àqueles representantes de vendas ou gerentes distritais/regionais, que atingiram uma determinada meta de vendas de um produto.

O valor do prêmio é repassado para a empresa Expertise, que repassa o valor para o funcionário através de um cartão saque.”

Passa-se à análise.

1 Quanto aos saques dos empregados por idéias eventualmente apresentadas, não vemos problemas trabalhistas.

Uma idéia apresentada por um empregado pelo processo produtivo é eventual,  não tem características de continuidade, com o que a sua natureza jurídica não é salarial , afastando-se do campo de incidência do salário e, portanto, dos reflexos sobre o contrato individual de trabalho.

Não se afasta a idéia de que o INSS queira a contribuição previdenciária sobre os respectivos valores, mas  são incabíveis porque não se trata de um ganho habitual do empregado.

Trata-se de um ganho  eventual.

Aplicável é o art. 201,§11, da Constituição Federal, assim redigido:

“Os ganhos habituais do empregado, a qualquer título, serão incorporados  ao salário para efeito de contribuição previdenciária e conseqüente repercussão em benefícios, na forma da lei”.

A eventualidade é medida em função de quem recebe e não de quem paga.

Assim, pode haver o sistema permanente, mas o saque deve ser esporádico, ocasional.

Não há uma lei determinando em que casos o ganho é ou não é habitual.

Assim, a habitualidade é uma questão resolvida por um princípio lógico. SE o empregado ganha todo mês ou em cada bimestre , haverá habitualidade. Se o ganho é dependente de uma condição que só pode pela sua natureza realizar-se eventualmente, como uma idéia que proporciona um ganho uma única vez num ano, ou talvez nunca mais, não será habitual. 

t

2. Quanto  ao pessoal da área de vendas que têm  direito ao saque-cartão por atingirem metas de vendas fixadas pela empresa, a situação difere e melhor será alterar o sistema.

Dois aspectos podem levar o intérprete a concluir que se trata de salário – caso em que incidem todos os reflexos sobre a folha de salário, décimo terceiro salário, recolhimentos de FGTS, contribuições do INSS etc- , apesar de pago por terceiro e não diretamente pelo empregador.

Primeiro, os saques  são constantes, mensais ou bimensais, 

Segundo, a condição  para auferí-lo coincide com a das comissões ou prêmios habituais de produção.

O fato de ser triangularizado o pagamento por meio de saques em  cartões atendidos diretamente por uma empresa especializada em faze-lo, não afasta a incidência do campo salarial.

Há outras situações nas quais as leis consideram salário pagamentos vindos de terceiros e não diretamente do empregador como no caso das gorjetas ( CLT art. 457) que  provém dos fregueses  e não do empregador de quem as recebe. A doutrina  justifica a inclusão no salário de pagamentos provenientes não do empregador mas de terceiro na teoria da oportunidade de ganho. Assim, mesmo que o empregador não pague diretamente mas desde que enseje essa oportunidade ao empregado em razão do serviço que lhe presta, não fica descaracterizada a natureza salarial do pagamento. 

Não quer isso dizer que uma empresa de saque-cartão ou de brindes seja ilegal.

Não é ilegal uma empresa que opera com cartão-convênio,  produto que consiste em convênio entre  empresa e a fornecedora, do qual serão titulares empregados das conveniadas e que os autoriza a fazer compras no comércio em valores que serão descontados, pelos empregadores, dos seus respectivos salários em folha de pagamento até o montante dos valores devidos pelo cartão.

Há, também, precedente da Lei n.10.820, de 17.12.2003, que autoriza  descontos nos salários e nas verbas rescisórias, para pagamento de empréstimos, financiamentos e operações de arrendamento mercantil concedidos por instituições financeiras e sociedades públicas ou privadas, quando expressamente autorizados pelo beneficiário, até o limite de 30% do valor do benefício, sendo a autorização irrevogável e irretratável.

Assim, o que se pode depreender da legislação existente sobre o tema, é uma certa inflexibilidade inicial, trazendo uma taxatividade estrita quanto a essas hipóteses mas uma crescente flexibilização com situações novas que nem sempre a Fiscalização Trabalhista e Previdenciária aceitam.

Estão nessa perspectiva de flexibilização a retirada da natureza salarial ( CLT art. 468) de diversas utilidades:

– integração em plano de assistência odontológica;

– plano médico-hospitalar;

– plano de seguro;

– plano de previdência privada;

– plano de entidade cooperativa, cultural ou recreativa associativa dos seus trabalhadores, em seu benefício e dos seus dependentes;

São Paulo, 30  de junho  de 2.006



Dr. Marcelo Mascaro

Advogado do Trabalho, CTO

Gostaria de falar com nossos advogados?

Fale conosco WhatsApp

Assine nosso boletim semanal

Não perca nossos conteúdos de vista. Cadastre-se agora e receba nossa seleção de artigos e notícias, diretamente no seu e-mail.

Nome
Ao informar meus dados, concordo com a política de privacidade.(obrigatório)
Ao informar meus dados, concordo com a política de privacidade.