Relações coletivas de trabalho
Sem categoria - 18/11/2022

Reflexos jurídicos das relações coletivas de trabalho

A — PODER NORMATIVO DOS GRUPOS SOCIAIS. Que é poder normativo dos grupos sociais? Há instrumentos coletivos de regulação dos interesses dos grupos. O direito do trabalho não é um direito unicamente codificado, legislado. Ao contrário de outros domínios jurídicos, é um direito também regrado pelos próprios interlocutores sociais. A regulamentação jurídica entre os próprios grupos tem alta eficácia. Por meio de suas representações, os grupos direcionam a defesa dos seus interesses coletivos pelas negociações com os patrões. Estes também se organizam e são representados.

As negociações têm tudo de um processo de elaboração normativa. Há um poder normativo dos grupos. É o poder de criar normas e condições de trabalho que serão obrigatórias em todo o grupo. Trata-se de um procedimento de autoelaboração normativa. Esse aspecto revela, particularmente, toda a importância das relações coletivas de trabalho, na medida em que desempenham um papel instrumental, contratual, coletivo, do grupo, vinculando, mediante enlaces jurídicos reconhecidos pelo ordenamento de cada país, os sujeitos coletivos pactuantes.

Há normas jurídicas coletivas, não elaboradas pelo Estado. O Estado não é a única fonte formal do direito. O direito é produzido pelo Estado, mas, também, pelas relações coletivas trabalhistas. Logo, as relações coletivas transcendem ao âmbito individual. São transindividuais. Mais que isso, são coletivas. Funcionam como uma das mais importantes fontes formais do direito positivo na sociedade industrial. Manifestam-se como expressão do pluralismo jurídico.

Outro efeito jurídico das relações coletivas é no plano jurisdicional, matéria estudada no direito processual do trabalho. As relações coletivas desenvolvem-se na esfera social, ingressam no ordenamento jurídico quando se expressam por meio da negociação coletiva, conflitual, com a greve ou não, e podem desembocar perante o Poder Judiciário mediante a ação coletiva ou dissídio coletivo, que é um processo judicial que exigirá uma decisão do Tribunal do Trabalho. A decisão denomina-se sentença normativa. Reivindicação, confrontação, negociação, autocomposição ou decisão judicial são evidências da vida das relações coletivas.

B — INTERESSE PÚBLICO E INTERESSE COLETIVO. Interesse público e interesse coletivo são coincidentes ou contrapostos? Podem coincidir em certas ocasiões. Mas, em princípio, não se confundem. Interesse coletivo, compreendido como o interesse do grupo profissional ou econômico, nem sempre se identifica com o interesse público. Este é o interesse maior da sociedade organizada, como a proteção do patrimônio público, do meio ambiente e da ordem jurídica. Quem o defende é a própria sociedade, por meio das instituições constitucionalmente designadas para esse fim. Interesse coletivo é o de um grupo. Se o grupo é de trabalhadores ou de empregadores, as relações que entre eles se desenvolvem são trabalhistas.

A Constituição Federal de 1988 (art. 129) atribuiu a defesa do interesse público ao Ministério Público, pela ação civil pública e por outros mecanismos. Foi mais além. Conferiu-lhe, também, a defesa dos interesses sociais e individuais indisponíveis (art. 127) e a proteção dos interesses difusos e coletivos (art. 129, III). Estamos, aqui, diante de uma questão delicada, nova, ainda não solucionada, porque a Constituição (art. 8º, III) conferiu ao sindicato a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria.

C — INTERESSES DIFUSOS, COLETIVOS E INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. Que são interesses difusos e em que diferem de interesses individuais e interesses individuais e homogêneos?

Não é demais lembrar que as palavras interesse e direito têm significados diferentes, embora próximos, tendendo a primeira a se referir à pretensão que pode ser pleiteada perante o Poder Judiciário e a segunda, à garantia conferida pela norma jurídica da qual uma pessoa se sente provável titular.

Já as expressões interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos ganharam amplitude com o Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078, de 1990, art. 81, parágrafo único).

Esse Código as define da seguinte forma:

1) interesses ou direitos difusos são os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato, servindo, como exemplo, o direito da sociedade na defesa ambiental;

2) interesses ou direitos coletivos são os transindividuais de natureza indivisível, de que seja titular o grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica de base, o que corresponderia, no âmbito trabalhista, às reivindicações que um Sindicato faz para a categoria de trabalhadores, perante a categoria econômica, ambas representadas por suas entidades sindicais, por meio de um processo no Tribunal do Trabalho denominado dissídio coletivo, do qual resulta uma sentença normativa genérica, para todos os integrantes da categoria, o que permite ao Sindicato, individualizando o crédito de cada um, ou ao próprio titular do direito material, a sua execução judicial;

3) interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum, o que corresponderia, na esfera trabalhista, ao pleito de um sindicato em nome próprio para a condenação de uma empresa que não concede intervalo na jornada de trabalho para os seus empregados.

Esses conceitos são novos e ainda estão em fase de aprofundamento pela doutrina e, como se vê, têm uma importância não só no plano do direito material, mas, principalmente, do direito processual para definir a legitimidade da parte que propõe a ação. Desde já, permitem concluir que a diferença entre os mesmos reside principalmente na indivisibilidade dos direitos difusos, e na divisibilidade e individualização dos direitos coletivos depois de uma sentença genérica de execução particularizada, e dos direitos individuais homogêneos que, como o nome indica, são individuais, mas surgem de uma lesão comum, podendo ser pleiteados tanto pelo Sindicato como separadamente pelo titular do direito material.Fonte: NASCIMENTO, Amauri Mascaro, NASCIMENTO, Sônia Mascaro. Iniciação ao Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2018, 41. ed. P. 483/484.

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Dr. Marcelo Mascaro

Advogado do Trabalho, CTO

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