Professor Amauri Mascaro (in memoriam) expõe as utilidades e o salário no Direito do Trabalho

Amauri Mascaro (in memoriam)

As utilidades e o salário no Direito do Trabalho

Utilidades são os bens econômicos atribuídos ao trabalhador por aqueles que se valem dos seus serviços e que tenham conteúdo financeiro mensurável. Fala se, também, de salário in natura. Deve-se destacar que as utilidades muitas vezes têm natureza salarial, hipótese na qual se refletem nos demais direitos trabalhistas dos profissionais.

Inicialmente, deve-se destacar que a principal característica da utilidade, salarial ou não, é sua forma de pagamento, que em hipótese alguma poderá ser em pecúnia, ou seja, em espécie. A utilidade é sempre determinado bem econômico que, a despeito de ter valor financeiro, deve se paga “in natura”, sob pena de que sua natureza salarial seja configurada se paga diretamente em dinheiro.

Dizemos isso porque tem-se tornado praxe corrente no mercado o pagamento de utilidades em contracheque, tais como uniformes ou equipamentos de informática. Ao invés de se concederem os bens econômicos, paga-se uma quantia equivalente a este título a fim de se esquivar dos encargos sociais e tributários da parcela salarial.

É verdade que essa modalidade de retribuição econômica por utilidades é admitida e regulamentada em nosso ordenamento, mas com algumas restrições. Inclusive constatou-se, na prática uma notável expansão dessa forma de pagamento mais recentemente, chegando a beneficiar até mesmo altos empregados, por meio de cartões de crédito, passagens aéreas, automóvel, mensalidades de clubes etc.

Todavia, a iniciativa empresarial da concessão de vantagens em utilidades retraiu-se onde os encargos sociais passaram a incidir sobre os valores correspondentes aos bens fornecidos, como recolhimentos de contribuições previdenciárias, subsídios para o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, incidência de imposto de renda e outros, mesmo porque muitas empresas acabavam mascarando o pagamento de verbas salariais através de diferentes utilidades, sendo alvos fáceis das fiscalizações do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e do Ministério Público do Trabalho (MPT).

A cautela na utilização desse mecanismo de retribuição justifica-se frente à postura da nossa Justiça do Trabalho, que, quando acionada pelos empregados, tem sistematicamente atribuído caráter salarial a inúmeros tipos dessas utilidades, e pela atuação fiscalizadora do INSS, que se ocupa em controlar o correto adimplemento das obrigações previdenciárias, já que “a responsabilidade do tomador do serviço pelas contribuições previdenciárias é solidária”, nos termos do art. 31 da Lei n. 8.212/91.

Daí a importância de se discorrer sobre os critérios de diferenciação entre as utilidades salariais e as não salariais. Com efeito, distinguem-se os tipos de utilidades segundo a finalidade da sua atribuição, a fim de considerar salariais as que são atribuídas pela prestação de serviços e não salariais as que são apenas para a prestação de serviços.

O que se pretende dizer é que quando uma utilidade é necessária para que o serviço possa ser executado, pode ser identificada a um equipamento ou a um instrumento de trabalho, o que retira a sua natureza salarial. Nesse caso, é apenas meio. Não é fim. Resta ausente, assim, o requisito da contraprestatividade.

As origens desse entendimento estão na CLT, art. 458, § 2º segundo o qual “não serão considerados como salário, para os efeitos previstos neste artigo, os vestuários, equipamentos e outros acessórios fornecidos ao empregado e utilizados no local de trabalho, para a prestação dos respectivos serviços”.

Dessa maneira, a lei excluiu do âmbito salarial os vestuários, equipamentos e quaisquer outros acessórios utilizados pelo trabalhador no local de trabalho, destinados à prestação de serviços, ensejando, assim, a construção doutrinária, largamente preconizada no direito brasileiro, da teoria finalística, que, para definir se uma utilidade é salarial ou não, verifica se foi atribuída para ou pela prestação de serviços, não se incorporando ao salário no primeiro caso, pela sua função habilitadora do desempenho das funções, e se incorporando no segundo caso, pela conotação contraprestativa de retribuição ao trabalho prestado ou à disponibilidade do trabalhador.

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