Professor Amauri Mascaro Nascimento (in memoriam) aborda os termos de como deve ser o contrato.

Licitude, utilidade e justiça no contrato
Amauri Mascaro Nascimento (in memoriam)

Ao ordenamento jurídico compete, não apenas, sistematizar o complexo de normas e relações jurídicas no universo em que atua e desenvolve a sua trajetória para a consecução dos seus fins. Nele, o contrato ocupa um importante espaço de realização de enlaces jurídicos intersubjetivos.

Imagine-se – já que quantificar é impossível – o número de contratos de trabalho diariamente constituídos e desfeitos no mundo.

É que contrato não é o mesmo que um documento escrito, e essa falsa ideia deve ser afastada, embora possa existir a formalização do contrato por meio de linguagem escrita. São, também, formas contratuais no direito do trabalho, válidas como a escrita, muitas outras: a verbal, a tácita e até mesmo, em alguns sistemas, a presumida. Todas são contratos de trabalho.

Acrescente-se – conquanto não consistente –  a teoria objetivista, que dispensa a vontade para a formação do vínculo de emprego, contentando-se com a coincidência entre a tipicidade legal e o modo como o trabalho é prestado. O contrato tácito e a relação objetivista do anticontratualismo praticamente coincidem. Se houver diferença, é qual imperceptível. Talvez a diferenciação resida no animus contraendi, que é a intenção voltada para a contratação ignorada pela teoria objetivista.

Voltando ao tema, o valor não pode estar ausente de um contrato, como o de trabalho, no qual o próprio ser humano se emprenha com sua força de trabalho posta a serviço de outrem.

O contrato de trabalho deve ser lícito, útil e justo.

O problema da ilicitude tem uma especificidade.

Não pode ser resolvido com base nos conceitos de direito civil. Neste, o ato nulo não produz efeitos, mas no direito do trabalho o contrato ilícito pode produzir efeitos enquanto perdurou, porque não seria justo alguém trabalhar, não receber salário nem outros direitos porque o contrato é ilícito.

A ilicitude impede a continuidade do contrato, mas não a reparação dos créditos pelo tempo em que a relação de emprego se desenvolveu. É nesse sentido que a doutrina fala em irretroatividade das nulidades.

O contrato deve ser útil – a afirmação nada tem que ver com o utilitarismo -, o que quer dizer que os interesses dos sujeitos devem ser realizados e harmonicamente.

O contrato deve ser justo.

Deixar à livre vontade das partes a realização do justo é problemático. O justo, quando não espontâneo, é introduzido no contrato de modo heterônomo, pela interferência da lei, que impõe os valores que devem presidi-lo.

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