Dr. Marcelo Mascaro faz um apanhado histórico da Justiça do Trabalho, mostrando como esta sofreu profundas transformações desde sua criação em 1934.

Direito do Trabalho
O significado da Justiça do Trabalho
Marcelo C. Mascaro Nascimento

A Justiça do Trabalho foi primeiramente prevista pela Constituição Federal de 1934. Anteriormente, já em 1923, havia sido instituído o Conselho Nacional do Trabalho no âmbito do Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio, que concebeu um sistema administrativo de âmbito nacional para a solução de conflitos trabalhistas. Suas decisões, porém, podiam ser alteradas pelo Ministério do Trabalho ou pela Justiça Comum.

Após a previsão da Justiça do Trabalho, na Constituição Federal de 1934, ela foi de fato criada em 1936 pelo decreto-lei 1.237. Surgiu, porém, como órgão subordinado ao Poder Executivo e sem caráter jurisdicional.

Sua criação está intimamente relacionada ao projeto corporativista de Estado disseminado durante do governo Vargas. Tal projeto, declaradamente propunha a composição entre capital e trabalho, sendo avesso a qualquer conflito entre trabalhadores e empregadores.

A sociedade, controlada pelo Estado em suas diversas instâncias, deveria expressar uma relação harmônica entre capital e trabalho. Assim, era necessário que qualquer conflito de natureza laboral fosse coibido ou extinto o quanto antes.

Para isso, por um lado, o domínio do Estado sobre os sindicatos, aliado às características do modelo sindical corporativista brasileiro, possibilitava um controle prévio das relações entre capital e trabalho.

Por outro, a criação de uma Justiça especializada capaz de resolver os conflitos laborais rapidamente também elidia as sementes de um conflito social maior. Nesse sentido, inclusive, se destaca o caráter conciliatório dessa Justiça, desde seu início, o que depois passou a ser incorporado pela Justiça Comum.

Assim, a Justiça do Trabalho foi criada objetivando exercer um controle social com vistas a elidir os conflitos de classe, para exercer o poder normativo, de modo a permitir a criação de normas por esse órgão e para implementar um processo célere, barato, em que prevalece a oralidade processual e informal.

Além disso, a Justiça do Trabalho também foi criada com vistas a compensar a desigualdade econômica entre as partes do processo. Por isso, por exemplo, a existência de procedimentos próprios, como o princípio do jus postulandi.

Isso explica a composição tripartite da Justiça do Trabalho à época e a existência de juízes leigos, pois se acreditava que esses juízes a tornariam mais informal e, assim, capaz de solucionar os conflitos de forma mais rápida.

Com o fim do Estado Novo, a Constituição Federal de 1946 a incorporou ao Poder Judiciário, afastando sua subordinação ao Poder Executivo. Ainda ao longo das décadas seguintes, sofreu importantes modificações, tais como a extinção dos juízes classistas pela Emenda Constitucional nº 24 de 1999 e a ampliação de sua competência pela Emenda Constitucional nº 45 de 2004.

Nota-se, dessa forma, que a Justiça do Trabalho sofreu profundas transformações desde sua criação. Ela não representa mais uma instituição voltada para a implementação do corporativismo de Estado. Atualmente, se trata de uma entidade do Poder Judiciário, competente para solucionar os conflitos trabalhistas, fazendo-o de forma mais célere do que outros órgãos.

Deve-se ressaltar que muitas características e princípios inicialmente próprios da Justiça do Trabalho, ao longo dos anos foram incorporados pela Justiça Comum, como a oralidade e a celeridade processual.

Ademais, não se pode negar a desigualdade econômica existente entre empregador e empregado, o que fundamenta ainda hoje uma Justiça com características e princípios próprios, de modo não a beneficiar uma parte, mas tornar a relação processual equilibrada.

Esse fato é de suma importância e não pode ser desconsiderado em um Estado Democrático de Direito. Exemplo disso é que diversos países de tradição democrática possuem uma justiça especializada para as causas trabalhistas, seja em instância ordinária ou superior. É o caso de Alemanha, Bélgica, Canadá, Espanha, França, Inglaterra, Irlanda e Suécia, entre outros.

Também a Organização Internacional do Trabalho (OIT), por sua vez, não só reconhece as Justiças especializadas nas causas laborais, como promove eventos periódicos de encontros desses magistrados, demonstrando mais uma vez que uma Justiça especializada em causas trabalhistas é um exemplo encontrado em todo o globo.

Compartilhe