A competência territorial do empregado em home office

Por Dr. Marcelo Mascaro Nascimento

A competência territorial da Justiça do Trabalho é definida pelo artigo 651 da CLT, que prevê quatro regras para estabelecer a localidade da Vara do Trabalho onde a reclamação trabalhista deverá ser ajuizada.

A regra principal é o local da prestação do serviço. Nos termos do caput do dispositivo, a ação deve ser ajuizada na localidade onde o empregado, seja ele reclamante ou reclamado, prestar o serviço ao empregador, ainda que a contratação tenha ocorrido em outro local ou no exterior.

Se, porém, o empregado for agente ou viajante comercial, em razão de o trabalhador não se fixar em nenhum ponto, o § 1º do artigo 651 define como Vara competente aquela da localidade onde a empresa tenha agência ou filial à qual o empregado está subordinado, por exemplo, onde ele presta contas de suas vendas. Contudo, não havendo esse local, a competência será da Vara de seu domicílio ou localidade mais próxima.

Outra regra diz respeito às empresas que exercem atividade em vários locais. Nesse caso, se o trabalhador atuou ou atua em várias localidades, a ação trabalhista pode ser ajuizada na da celebração do contrato ou da prestação do serviço. Essa regra tem aplicação, por exemplo, para os empregados que sofrem transferência ou cuja natureza do serviço exige se fixarem em distintos locais.

Por fim, a quarta regra se destina aos empregados brasileiros que trabalham em filial de empresa nacional em outro país. O empregado que trabalha em uma filial de empresa brasileira no exterior, desde que não haja tratado internacional dispondo de forma diversa, seguirá regras anteriores.

Embora não previsto expressamente, tais regras também se aplicam ao trabalho realizado em domicílio, a exemplo do teletrabalho. Nesse sentido, o empregado que presta o serviço de sua própria residência poderá ajuizar reclamação trabalhista na Vara do Trabalho de seu domicílio.

Se, contudo, houver alternância entre o trabalho presencial no estabelecimento do empregador e o trabalho em domicílio, a competência territorial para o ajuizamento da ação será qualquer uma dessas localidades.

Em que pese a questão da competência territorial aparentar ser de simples solução, na prática das relações de trabalho podem surgir situações de maior complexidade.

O avanço das tecnologias da informação permite oferecer ao trabalhador uma grande flexibilidade quanto ao local de trabalho, não havendo necessidade que a prestação do serviço ocorra exatamente em sua residência.

Não raro nos deparamos com profissionais que não se limitam a executar seu trabalho em sua moradia e, por vezes, o fazem em casas de veraneio, locais de trabalho compartilhado ou mesmo no exterior.

Tal fato pode acarretar certa dificuldade ao empregador. A possibilidade de pulverização dos locais de trabalho permitida pelo home office em conjunto com a flexibilidade dado ao empregado de prestar o serviço em qualquer lugar que lhe convenha pode colocar o empregador em risco de ter uma ação trabalhista ajuizada contra ele em qualquer Vara do Trabalho do território nacional.

É verdade também que a Constituição Federal tem como direito fundamental o acesso à Justiça (art. 5º, XXXV) e que a condição de hipossuficiente do empregado merece maior proteção, inclusive, com a criação de mecanismos capazes de facilitar o acesso ao Poder Judiciário.

O conjunto das regras contidas no art. 651 da CLT se mostra coerente com tais princípios. A regra geral que estabelece a competência territorial como sendo do local da prestação do serviço possui dois méritos.

O primeiro diz respeito à maior facilidade de colheita de provas e de instrução processual no local da prestação do serviço. O segundo é quanto à pressuposição de que o empregado, na maior parte das vezes, também reside na localidade do trabalho. Em relação a esse último, caso o empregado tenha sido transferido para outro local de trabalho ou a natureza de seu serviço faça com que ele se fixe em diversas localidades, ele ainda tem a possibilidade de ajuizar a ação em qualquer uma delas ou no lugar da celebração do contrato.

Nota-se com isso que a CLT estabeleceu como critério para a definição da competência territorial a fixação a um posto de trabalho, ainda que por breve período. Contraposto a isso está o caso do empregado agente ou viajante comercial. Nessa hipótese, embora o trabalhador visite diversas localidades ele não se fixa nem mesmo momentaneamente em nenhuma delas, razão pela qual elas não são contempladas pela competência territorial da Justiça do Trabalho.

Sugerimos que essa mesma sistemática se aplique ao trabalho em home office, ou seja, que a competência territorial seja definida pela localidade da prestação do serviço, desde que o trabalhador tenha se fixado minimante nesse local.

Caso isso não se verifique, o que pode ocorrer, por exemplo, com os chamados nômades digitais, que se definem justamente por não possuir uma base fixa de trabalho e cultivar um estilo de vida de constante deslocamento, poderá ser aplicado por analogia o § 1º do art. 651, ou seja, as mesmas regras destinadas ao empregado agente ou viajante comercial.

Dessa forma, entendemos preservar o direito ao acesso à Justiça do empregado, sem desconsiderar sua condição de hipossuficiente, e oferecer um mínimo de previsibilidade ao empregador quanto aos possíveis locais que poderá enfrentar uma ação trabalhista.

NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Ordenamento jurídico trabalhista. São Paulo: LTr, 2013. p. 313-315.

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