Ainda a rotatividade da mão-de-obra

Hélio Zylberstajn/Professor Sênior da FEA/USP e Coordenador do Projeto Salariômetro da Fipe

No último número deste boletim, abordei a questão da rotatividade da mão-de-obra no Brasil. Volto ao tema com mais alguns detalhes estatísticos e procurando vincular este fenômeno com o ritmo da atividade econômica. Como da vez passada, utilizarei os dados do CAGED, os mais adequados para tratar do tema.

O CAGED informa mensalmente a quantidade de admissões e de desligamentos no mercado de trabalho regulamentado pela CLT. Para elaborar este pequeno texto, utilizei o CAGED no período de janeiro de 2004 a abril de 2021 e considerei, além da quantidade de admissões e desligamentos, outra informação oferecida pelo Ministério da Economia, que hoje cuida do sistema CAGED.

Este órgão calcula e disponibiliza a quantidade total de empregos com carteira assinada, que denomina como “estoque” de empregos. No período considerado, tivemos, em média 35,365 milhões de empregos com carteira assinada, a cada mês. E, a cada mês acrescentamos, em média, 81 mil novos empregos ao estoque.

Para produzir o ganho mensal de 81 mil empregos, as empresas brasileiras contrataram, em média, 1,437 milhões novos empregados e desligaram 1,355 milhões. Como se vê, nosso mercado promove uma movimentação considerável de trabalhadores, para um resultado bem modesto na expansão do emprego (Tabela 1).

Estes números resumem o comportamento do mercado formal de trabalho brasileiro. Para completar a observação e obter um quadro mais detalhado, é preciso decompor os grandes números nos seus valores mensais. Isso é feito, inicialmente, no Gráfico 1, que apresenta a evolução mensal das admissões (curva azul), dos desligamentos (curva vermelha), ambas referenciadas no eixo vertical esquerdo.

O Gráfico 1 apresenta ainda a evolução mensal do estoque de empregos (curva preta), referenciada no eixo vertical direito. Tivemos dois períodos distintos no intervalo considerado. No primeiro, que vai de janeiro de 2004 a junho de 2014, o nível de emprego cresceu continuamente até atingir a marca dos 40 milhões de postos de trabalho.

Neste período, a quantidade de desligamentos e de admissões acompanhou o ritmo do crescimento do emprego. A partir de meados de 2014, com o esgotamento da estratégia econômica dos governos do PT, o nível de emprego se reduziu e a movimentação da mão-de-obra se contraiu pronunciadamente.

No primeiro período, a curva das admissões se situou claramente acima da curva dos desligamentos e o contrário ocorreu no outro período. O Gráfico 1 mostra, claramente que a intensidade da movimentação da mão-de-obra acompanha o comportamento da atividade econômica: cresce na expansão e se contrai na recessão.

Com os dados do CAGED e do estoque de empregos, é possível calcular a taxa de rotatividade da mão-de-obra, a cada mês.¹ A taxa de rotatividade representa matematicamente a magnitude com que a força de trabalho é substituída.

Uma taxa de rotatividade de 3%, por exemplo, indica que, no período em que foi calculada, a empresa substituiu 3% dos seus trabalhadores. O resultado do cálculo da taxa de rotatividade é apresentado no Gráfico 2, a seguir. Assim como no Gráfico 1, aparecem claramente os dois períodos já referidos.

No primeiro, observa-se a tendência clara de crescimento da rotatividade, seguida no segundo período por uma tendência contrária, de redução. Não é difícil entender por que a rotatividade acompanha os movimentos da atividade econômica.

Na expansão, as oportunidades de trabalho crescem e os trabalhadores se sentem seguros para procurar melhores colocações. Isso também explica ao movimento ascendente dos salários que normalmente ocorre nestes períodos.

Por outro lado, quando a atividade econômica se reduz, os empregados ficam mais cautelosos diante da escassez de opções no mercado de trabalho.

O Gráfico 1 mostra exatamente a amplitude destas oscilações. No período considerado, a taxa de rotatividade oscilou entre 0,4% em dezembro de 2013 e 4,9% em março de 2012. Em média, a substituição de mão-de-obra formal foi de 3,7% ao mês.

Em síntese, os dados mostram duas características da rotatividade no Brasil. Primeiro, é um fenômeno pró-cíclico, acompanhando pari passu os movimentos da economia. Segundo, é muito elevada. A rotatividade, em si, não é ruim, porque a movimentação dos trabalhadores os leva a melhores encontros na sua trajetória profissional. Mas, em níveis excessivamente elevados, é nociva porque indica que o nível de compromisso e a ética do trabalho entre nós são muito baixos, o que afeta negativamente a produtividade do trabalho.

1 Como no texto anterior, a taxa de rotatividade mensal é calculada por meio da seguinte fórmula: Taxa de rotatividade = [valor mínimo entre admissões e desligamentos] / Estoque médio de empregados no período. O valor mínimo entre admissões e desligamentos é exatamente a quantidade de empregados substituídos no período. Quando o saldo entre admissões e desligamentos é positivo, as admissões superam os desligamentos, que, neste caso, é igual à quantidade de substituições. Quando o saldo é negativo, a quantidade de admissões é igual às substituições. O estoque médio é a média entre o número de empregados no final do mês anterior e no final do mês de referência.

Compartilhe