O fornecimento de instalações sanitárias aos trabalhadores externos

o fornecimento de instalacoes sanitarias e norma de seguranca e higiene do trabalho

Por Marcelo Mascaro Nascimento, sócio do escritório Mascaro Nascimento Advogados.

O fornecimento de instalações sanitárias pelo empregador ao empregado trata-se de norma de segurança e higiene do trabalho. Ele é regulamentado pela NR nº 24 do Ministério do Trabalho e Emprego, que estabelece condições mínimas de higiene e conforto a serem observadas pelo empregador. No tocante às instalações sanitárias especificamente, seu item 24.2.1. dispõe que “todo estabelecimento deve ser dotado de instalação sanitária constituída por bacia sanitária sifonada, dotada de assento com tampo, e por lavatório”.

A norma busca assegurar não apenas a higidez do ambiente de trabalho e a saúde do trabalhador, como também preservar sua intimidade e privacidade, fundamentos intrínsecos à dignidade humana e garantidos constitucionalmente pelo art. 5º, X, e art. 7º, XXII, da Constituição Federal.

Em que pese os fundamentos constitucionais que justificam a obrigatoriedade de o empregador fornecer instalações sanitárias a seus empregados, discute-se se essa exigência também seria aplicada àqueles que desenvolvem atividades externas.

Incompatibilidade com a natureza da atividade

Argumenta-se que a natureza da atividade desses trabalhadores seria incompatível com o fornecimento de instalação sanitária pelo empregador, uma vez que é impraticável que a empresa disponha de tais instalações em vias públicas ou estabelecimentos de terceiros.

Defende-se, também, que inexiste lei que obrigue o empregador a propiciar sanitários móveis e que o trabalhador nessas condições sempre poderá utilizar-se de sanitários em estabelecimentos comerciais.

Divergências quanto à aplicação da Lei

Durante certo período esse parecia ser o posicionamento dominante, mas não unânime, da jurisprudência do TST (1). De fato, a NR nº 24 do Ministério do Trabalho em Emprego ao dispor que todo estabelecimento deve ser dotado de instalação sanitária parece se referir exclusivamente ao estabelecimento do empregador e não à necessidade de garantir tais instalações também fora de seu estabelecimento.

Não obstante, parte da jurisprudência entende pela aplicação da norma regulamentar também aos trabalhadores externos com fundamento nos princípios constitucionais mencionados anteriormente, na existência de exclusão expressa da aplicação da NR nº 24 aos trabalhadores externos e no fato de que os estabelecimentos comerciais têm seu funcionamento restrito aos horários comerciais (2).

A divergência levou a questão à SBDI-1 do TST, que acabou por entender pela obrigação de o empregador assegurar o acesso a instalações sanitárias também aos trabalhadores externos. Vejamos:

“INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. ATIVIDADE EXTERNA. LIMPEZA URBANA. FALTA DE CONDIÇÕES ADEQUADAS PARA O TRABALHO (LOCAL PARA REFEIÇÕES E SANITÁRIOS). 1 – Não se pode admitir, a esta altura da evolução do Direito, instrumento de construção civilizatória, que sejam negadas condições dignas de trabalho em razão do tipo de atividade exercida. Pelo contrário, quanto mais pesada e sofrida é a atividade exercida, caso do agente de limpeza externa, aí mesmo é que o princípio da proteção deve ser mais presente. A Constituição Federal de 1988 colocou a pessoa humana no centro da ordem jurídica, sinalizando em toda sua estrutura e seus princípios para a necessidade de inclusão dos trabalhadores e afirmação dos direitos. Nesse contexto é que se deve conferir máxima efetividade aos princípios da dignidade da pessoa humana, da valorização do trabalho e do emprego, da justiça social, da proteção e do não retrocesso. 2 – Cabe ao empregador zelar pelas condições de trabalho dos seus empregados, uma vez que o direito previsto no art. 7º, XXII, da Constituição Federal, referente à redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança não exclui aqueles que realizam trabalho externo. Demonstrada a conduta ilícita da reclamada que atenta contra a dignidade da pessoa do trabalhador, fica configurado o dano moral. 3 – Constou no acórdão recorrido que: o reclamante exercia atividade externa (operador de máquina costal, ou seja, fazia a roçagem das vias públicas); não havia disponibilização de local adequado para refeições e de sanitários; o banheiro do barracão poderia apenas ser utilizado no começo e no final da jornada, sendo que durante, o empregado deveria buscar algum estabelecimento público. Sendo da empresa o risco da atividade econômica, deve buscar soluções para viabilizar o cumprimento das suas obrigações trabalhistas. No caso deste processo em que o trabalhador externo é um operador de máquina costal, nada impediria que fosse providenciado pela empresa carro de apoio com banheiro químico, local para esquentar a comida e estocagem de água. E nem precisaria haver um carro para cada local de trabalho, poderia haver até mesmo rodízio, ficando a critério da empregadora decidir qual seria a solução mais adequada, de acordo com as necessidades dos trabalhadores. 4 – Ademais, esta Corte tem decidido pela aplicação da NR 24 do Ministério do Trabalho aos trabalhadores externos de limpeza urbana, no sentido de assegurar condições sanitárias e de alimentação minimamente razoáveis. Há julgados. 5 – Recurso de revista de que não se conhece” (Ag-RR-1152-59.2017.5.09.0019, 6ª Turma, Redatora Ministra Kátia Magalhães Arruda, DEJT 28/06/2019).

Observa-se, assim, o entendimento de que o empregador deve oferecer aos trabalhadores externos meios de utilização de instalações sanitárias. A decisão oferece algumas possibilidades de fazê-lo, mas não de forma taxativa. Nesse sentido, entendemos que a questão surge como uma boa oportunidade de ser debatida em sede de negociação coletiva, em que se possa chegar à melhor forma de satisfazer o direito do empregado considerando as possibilidades fáticas do empregador.

Notas

1. Nesse sentido são os seguintes julgados: (AIRR-20796-25.2015.5.04.0333, Relatora Ministra: Dora Maria da Costa, 8ª Turma, Publicação: DEJT de 27/04/2018), (RR-1113-04.2013.5.09.0019, Relator Ministro: Guilherme Augusto Caputo Bastos, 5ª Turma, Data de Publicação: DEJT 02/10/2015), (RR-976-39.2012.5.04.0102, Relator Ministro: Aloysio Corrêa da Veiga, 6ª Turma, Data de Publicação: DEJT 07/11/2014), (AIRR-163700-37.2009.5.24.0005, Relator Ministro: João Oreste Dalazen, 4ª Turma, Data de Publicação: DEJT 29/08/2014) e (AIRR-987-75.2010.5.24.0007, Relator Ministro: Ives Gandra Martins Filho, 7ª Turma, Publicação: DEJT de 29/06/2012).

 2. Nesse sentido são os seguintes julgados: (AIRR-24711-18.2016.5.24.0066, 2ª Turma, Relator Ministro Jose Roberto Freire Pimenta, DEJT 15/10/2021) e (RR-111800-52.2012.5.17.0151, 3ª Turma, Redator Ministro Alexandre de Souza Agra Belmonte, DEJT 20/02/2015).

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