Hélio Zylberstajn comenta sobre redução do seguro-desemprego

Seguro-desemprego: cresçam e apareçam

Hélio Zylberstajn – FEA/USP

Até o momento em que este foi escrito, o governo estava revelando em doses não muito homeopáticas o tamanho do ajuste a os calos que vão doer. Surpreendentemente, a primeira dose, anunciada no final de dezembro, atingiu os interesses dos trabalhadores. Por meio de Medidas Provisórias, o governo alterou critérios para pensões, aposentadoria por invalidez, abono salarial, seguro-defeso e para o seguro-desemprego. A alteração no seguro-desemprego foi a mais relevante: elevou o período mínimo exigido de formalização no mercado de trabalho para a obtenção o benefício. Antes da MP, o período mínimo era de 6 meses não consecutivos nos 3 anos anteriores ao desligamento. Agora é de 18 meses não consecutivos nos últimos 2 anos, para quem nunca obteve o seguro-desemprego e de 12 meses nos últimos 16 meses para quem obteve o benefício uma vez. Para os que usufruíram mais de uma vez, o período mínimo é de 6 meses consecutivos antes do desligamento.

Parece pouco, mas não é. O governo espera economizar já em 2015, nada menos que R$18 bilhões, com o conjunto das medidas, e a maior parte virá das restrições ao acesso ao Seguro-Desemprego decorrentes do aumento no período exigido de formalização. Simulação do próprio Ministério do Trabalho calcula que se os novos critérios tivessem sido aplicados em 2014, a quantidade de pessoas habilitadas a receber o benefício teria sido 27% menor. O Gráfico a seguir confirma o potencial de impacto da medida. Nada menos que 60% dos trabalhadores brasileiros não completam um ano de serviço. Entre os jovens de 18 a 24 anos, essa proporção sobe para 70%.

Para muito trabalhadores não será fácil acumular 18 meses com registro em carteira nos últimos 24 meses, principalmente para os mais jovens. Esse foi o alvo do governo: dificultar o uso do Seguro-Desemprego exatamente para os que trocam de emprego com mais frequência, que são principalmente os indivíduos no início de suas carreiras profissionais. As autoridades acreditam que a causa do gasto excessivo no programa do seguro-desemprego é a rotatividade da mão de obra. De fato, a rotatividade no Brasil é enorme, como o gráfico mostra, e tem crescido nos últimos dois ou três anos. Mas o crescimento da rotatividade foi causado por desligamentos de iniciativa dos trabalhadores. Como o período recente lhes tem sido favorável devido à escassez de mão de obra, muitos trabalhadores pedem demissão porque encontram oportunidades mais atraentes. Nestes casos, os trabalhadores não têm direito ao Seguro-Desemprego, que pode ser utilizado apenas nos desligamentos de iniciativa do empregador. Portanto, é um engano atribuir o crescimento do gasto com o seguro-desemprego ao crescimento da rotatividade. A causa é outra e tem a ver com o crescimento real do Salário Mínimo.

De qualquer forma, com a economia estagnada em 2015, o quadro se inverterá. Os desligamentos por iniciativa dos trabalhadores serão menos frequentes, e as rescisões promovidas pelas empresas deverão crescer. O fluxo de trabalhadores que mudam de emprego porque têm uma oportunidade melhor e não usam o seguro-desemprego será substituído por um fluxo contrário, de trabalhadores demitidos que não encontrarão empregos e precisarão do benefício. Haverá muitas demissões, mas poucas substituições. As medidas anunciadas restringirão o acesso ao benefício exatamente no momento em que ele será mais necessário.

A escolha de restringir o acesso ao Seguro-Desemprego foi feita sob a ótica eminentemente fiscal. Decidiu-se reduzir o gasto e escolheu-se a maneira mais rápida de fazê-lo. Não custa lembrar que em geral, países que enfrentam recessões procuram reforçar o seguro-desemprego. No Brasil, infelizmente, está ocorrendo o contrário.

É ao mesmo tempo triste e irônico comparar o início do primeiro mandato de Lula com o início do segundo mandato de Dilma. Lula, ao assumir, lançou o programa “Primeiro Emprego”, que tentou (sem êxito) criar estímulos para as empresas contratarem mais jovens. Embora fracassado, aquele programa indicava que havia alguma preocupação do governo com o emprego dos jovens. As medidas recentes parecem ignorar as dificuldades dos jovens e até mesmo parecem culpá-los pela rotatividade e pelo uso excessivo do seguro-desemprego. Lula não conseguiu dar emprego aos jovens. Dilma provavelmente conseguirá mantê-los longe do seguro-desemprego. Ela parece querer dizer: Isso não é para vocês. Cresçam e apareçam.

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