A responsabilidade do empregador por acidentes no ambiente de trabalho.

Direito do Trabalho

Marcelo C. Mascaro Nascimento

Um dos temas que tem causado grande controvérsia e polêmicas nos meios trabalhistas é a responsabilidade civil decorrente de acidentes ocorridos no ambiente do trabalho. Alguns sustentam que, objetivamente, o empregador é responsável pelos infortúnios com seus empregados; outros argumentam que é necessária a comprovação de culpa ou dolo do empregador, para que este seja responsabilizado pelo acidente havido com algum de seus empregados.

A Constituição Federal de 1988 estabeleceu a responsabilidade subjetiva do empregador decorrente de acidente de trabalho. Ou seja, haverá a obrigação de reparar um dano decorrente de acidente de trabalho desde que o empregador tenha agido ou se omitido caracterizando dolo ou qualquer das modalidades de culpa (negligência, imperícia ou imprudência). Assim está redigido o referido dispositivo:

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

XXVIII – seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa;

De acordo com o disposto em nossa Carta Magna, a prova cabal de culpa ou dolo por parte do empregador é conditio sine qua non para o deferimento de indenização.

Por sua vez, o Código Civil de 2002 prevê a obrigação, entre particulares, de reparar os danos causados por ato ilícito. Em outras palavras, a regra geral é a de que somente a ilicitude do ato praticado é capaz de ensejar o dever de indenizar o prejuízo causado.

Uma particularidade do diploma civilista merece ser destacada. Consagrou-se, neste Código, a figura da responsabilidade objetiva em situações excepcionais. Ou seja, do dever de reparar independentemente de comprovação de culpa do ofensor.

Isso, no entanto, conforme ressalva expressa no parágrafo único do art. 927, só é aplicável aos casos previstos em lei ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo causador do dano, pela própria natureza da mesma, implicar riscos a terceiros.

O fundamento dessa ressalva repousa na concepção de que a responsabilidade está na própria atividade exercida pelo agente, pelo perigo que encerra em si mesma e por sua capacidade de causar danos a outrem.  Esta perspectiva ficou conhecida como “teoria do risco”, assim prevista no Código Civil:

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Retomando a teoria, temos a responsabilidade objetiva e subjetiva. Na doutrina trabalhista, consideram-se duas hipóteses de reconhecer a responsabilidade objetiva da empresa: as especificadas em lei, como danos causados ao meio ambiente, e aquelas em que a atividade desenvolvida pelo empregador, por sua natureza, represente risco para os direitos dos trabalhadores. Excluídas estas hipóteses, a responsabilidade do empregador será subjetiva, na qual se necessita da prova do dano, do nexo causal e da sua culpa ou dolo.

Esse ponto merece ser explorado com maior profundidade, pois persiste ainda muita confusão em torno da interpretação adequada desse dispositivo.

Um primeiro postulado merece destaque. A regulamentação civilista não postula ser desnecessária a comprovação do dano e da culpa do agente causador deste. Ao contrário, como não poderia deixar de ser, valoriza os elementos fáticos que indicam a materialidade e a autoria do dano causado ao empregado.

Excepcionalmente, em alguns casos, porque em virtude de expressa previsão legal ou porque o infortúnio guarda relação estreita com os riscos elevados e inerentes a uma atividade econômica do empregador que não foram neutralizados por este, entende-se que os riscos foram assumidos por este, razão pela qual pode haver a obrigação de indenizar eventual prejuízo. Trata-se, portanto, um rol restritivo de exceções ao princípio geral de que somente em caso de culpa e dolo é que o empregador deverá reparar o dano causado a um empregado.

Ainda que, à primeira vista, pareça haver uma antinomia entre tais disposições legais, uma leitura sistemática e mais aprofundada dessas normas revela plena compatibilidade entre o texto constitucional e o diploma civilista.

Em verdade, o dano somente deverá ser reparado se houver a comprovação de culpa do empregador ou se for decorrente dos riscos diretamente envolvidos no exercício regular da atividade econômica. Apenas se as atividades exercidas pelo trabalhador implicarem elevado risco é que o empregador deverá assumir de forma objetiva o dano eventualmente causado.

Nota-se, portanto, que inexiste na lei uma presunção de que todo e qualquer infortúnio no ambiente de trabalho seja necessariamente de responsabilidade dos empregadores. Nem sob a perspectiva da responsabilidade objetiva, tampouco à luz da teoria da responsabilidade subjetiva, dispensa-se a verificação de provas e indícios que apontem para o nexo de causalidade e, sobretudo, para a possibilidade de imputar o dano à ação ou omissão de um agente, caracterizando o chamado “nexo causal”. Somente se presente este, é que será possível responsabilizar o empregador por acidente de trabalho.

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