Demografia e mercado de trabalho

Demografia e mercado de trabalho
Hélio Zylberstajn – FEA/USP

Nos últimos anos, a economia brasileira não conseguiu deslanchar e o PIB cresceu a taxas modestas. Mas o fraco desempenho da produção foi acompanhado surpreendentemente de expressivo crescimento do emprego

Os economistas têm oferecido diversas explicações para as evoluções contraditórias nas duas dimensões da economia mas o foco deste artigo é outro: nosso objetivo é olhar para a frente, tentando verificar se esta situação pode continuar. Até quando poderemos expandir o mercado de trabalho mesmo crescendo pouco?
 
A Pesquisa Mensal do Emprego (PME) do IBGE pode lançar alguma luz sobre esta questão. A PME cobre as seis principais regiões metropolitanas do país (São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre, Salvador e Recife) e oferece diversas informações, das quais escolhemos duas: a População Economicamente Ativa (PEA) e a População Ocupada (PO). A PEA inclui os indivíduos que trabalham e os desempregados que procuram emprego. A PO inclui apenas os que trabalham. O Gráfico a seguir mostra a evolução das duas informações, desde março de 2002 até o último mês de agosto. As linhas contínuas representam os valores mensais das duas categorias e as linhas tracejadas indicam a tendência das mesmas. Pode-se observar claramente dois aspectos:
 
(a)        A distância entre as duas linhas, que representa a quantidade de desempregados, tem diminuído ao longo do período.
(b)        As linhas de tendência da PEA e da PO são crescentes e ambas têm concavidade voltada para baixo, indicando que a velocidade do crescimento está se reduzindo.

Em síntese, o gráfico indica que a quantidade dos trabalhadores que chegam ao mercado de trabalho tem sido menor que a quantidade de novos empregos. A não ser que a economia entre em algum tipo de crise e recessão, estamos provavelmente chegando a uma situação de esgotamento do mercado de trabalho, o que seria um fato novo na nossa história. Desde o início da industrialização, o trabalho tem sido um fator abundante e essa abundância sempre impediu o crescimento da renda dos trabalhadores. Hoje, aparentemente, estamos assistindo à reversão deste quadro.
 
Uma das justificativas para a legislação trabalhista é exatamente nossa incapacidade histórica de criar empregos em quantidades compatíveis com o tamanho da força de trabalho, sempre estruturalmente abundante. A abundância do trabalho deixa os trabalhadores desprotegidos em face da competição por empregos e para protegê-los a solução que encontramos foi o caminho da tutela do Direito do Trabalho. Mas, se estivermos de fato chegando à situação de escassez estrutural do fator trabalho, não seria talvez também a hora de rever os pressupostos da nossa legislação trabalhista?

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